sábado, 23 de novembro de 2013

         JOE, JACK, BOBBY, JOHNNY & SAM



Sam Giancana, o padrinho da Mafia de Chicago, conhecia Joe Kennedy de ginjeira. E também conhecia os filhos, Jack e Bobby, e respectivas fraquezas. E sabia que eles saíam ao pai na tendência para a pouca vergonha e para as mulheres. Se Giancana os conseguisse envolver em escusos negócios de saias e prostituição, é claro que ficaria na manga com material de primeira para eventuais futuras chantagens.
E eles caem que nem patinhos.
Antes de mais, caía Jack, ou seja o futuro presidente John Kennedy dos EUA.
E dá-se o caso inédito em toda a História americana, que é o presidente dos EUA e o chefe máximo da Mafia virem a ter a mesma amante.
Frank Sinatra passa a ser o elo de ligação entre os dois homens. Aliás, segundo alguns autores, é ele que  liga um circuito glamoroso e explosivo: Chicago-Hollywood-Washington.
E outro homem importante como oficial de ligação equidistante aos elementos em jogo, quer dizer, enquanto membro do clan Sinatra e cunhado de John Kennedy, é o actor inglês Peter Lawford - com muito bons empenhos na Mafia, aliás. Pode mesmo dizer-se que foi Peter Lawford quem pôs Sinatra na rota dos Kennedy.
John Kennedy era doido por mulheres. Declarava alegremente, se calhar já com um copito a mais, que a ambição maior da vida era deitar-se com todas as mulheres bonitas de Hollywood.
Mas sim, Jack Kennedy (ou John Kennedy) já durante os anos de guerra se deitara com algumas estrelas, June Allyson, Sonja Henie, Gene Tierney. E também, pasme-se ou não, Grace Kelly.
Durante as filmagens em Las Vegas de Os 11 do Oceano, o candidato John Kennedy (Jack) visitou o plateau, e o prestável Sinatra logo organizou um serão privado em intenção do senador. Peter Lawford, a páginas tantas desse serão, toma Sammy Davis de parte e pergunta-lhe se ele quer conhecer o aspecto que tem um milhão de dólares em notas. Se quisesse, bastar-lhe-ia abrir uma mala de couro castanho que estava em tal parte assim-assim.


Essa mala de couro castanho e tudo quanto lá estava dentro era o presente da Mafia para a campanha eleitoral de John Kennedy .


Sammy Davis recusou o privilégio de cheirar tanto dinheiro. Bastava-lhe saber que algures no Sand’s Hotel estavam quatro raparigas para entreter o senador naquela noite e que ele, Sammy, não queria ter nada a ver com o assunto e se ia embora assim que acabasse de filmar o que tinha a filmar. 


- Há coisas que eu não tenho necessidade  nenhuma de saber -  disse Sammy a Peter Lawford.
Sinatra estava a apresentar uma call-girl de luxo ao senador John Kennedy. Chamava-se ela Judy Campbell, tinha 26 anos, era por sua vez amante do actor Robert Wagner e também, como não podia deixar de ser, amante do mafioso Johnny Rosselli.
Mas esta Judy Campbell, muito antes de ser apresentada ao filho, fora amante do pai. Pelo testemunho de Marlene Dietrich, o problema do Kennedy filho era saber se as mulheres que a Mafia lhe punha à disposição já tinham ou não sido postas à disposição do pai. E muitas delas tinham. E não era por acaso. A Mafia conhecia o penchant dos Kennedy pelo belo sexo.
Kennedy e a call girl Judy Campbell tomaram o pequeno almoço na suite de Sinatra no Sands de Las Vegas e combinaram voltar a encontrar-se em Nova York. E o senador vai embora. E a call girl vai embora. E imediatamente uma equipa se apresenta para limpar todos os vestígios de pouca vergonha. E todos os negativos das fotos comprometedoras tiradas são queimados.
Em Abril de 1960, os membros do Rat Pack passam à qualidade de colectores de fundos para a campanha de Kennedy. Eles e Judy Garland, Tony Curtis, Janet Leigh, Angie Dickinson.
O Kennedy pai, ainda nesse mês de Abril, manda entregar um saco cheio de dinheiro ao padrinho mafioso Sam  Giancana. Portador? A call girl Judy Campbell.
(Pode não ter sido – e não foi - por acaso, que a personagem de Peter Lawford em Os 11 do Oceano,  a certa altura, diz: estou a pensar em comprar uns votos e em lançar-me na politica.


Nessa primavera de 1960, Sam Giancana pede ao dono do Club 500, de Atlantic City para mandar dinheiro para a zona Oeste da Virgínia e esquecer todas as dívidas de jogo de uma certa pessoa. Devem ter seguido para a Virgínia uns 50.000 dólares retirados do fundo de pensões do sindicato dos camionistas.
- Precisamos de comprar todos os eleitores desse estado -  explica Giancana ao seu pessoal.
A 10 de Maio de 1960, John Kennedy ganha as primárias do Oeste da Virgínia e dá um passo de gigante para ser ele o candidato do Partido Democrático à presidência.
E é mesmo. E ganha a Richard Nixon. E John Fitzgerald Kennedy é eleito presidente dos EUA em Novembro de 1960.
Mal é eleito presidente, John Kennedy pede à amante, Judy Campbell, que lhe arranje um encontro secreto em Miami com o chefe mafioso Sam Giancana. Meteu-se-lhe em cabeça usar a Mafia para eliminar Fidel Castro. E passa para as mãos de Campbell documentos secretíssimos relacionados com o projecto. Campbell arranja outro encontro entre o presidente e o mafioso no seu próprio apartamento, em Nova York. É então que Kennedy entrega dinheiro ao chefe da Mafia para o efeito. O terceiro encontro é no Ambassador East Hotel, de Chicago.
Mas Giancana não acreditava muito no êxito da operação. De resto, nem lhe interessava muito esse assunto do assassínio de Castro. O que lhe interessava era ir extorquindo dinheiro ao governo e ter o governo – e a democracia - dos EUA na mão.
Os   Kennedy estão quase a ser apanhados na rede que não era para eles, era para os mafiosos.
Em Dezembro do mesmo ano da eleição do irmão, 1960, Robert Kennedy (Bobby) é nomeado General Attorney, suponho eu que o equivalente a Procurador Geral. 

Sam Giancana sentiu-se então de cavalinho e à margem de todos os inquéritos ao crime organizado, graças ao pacto em tempo firmado com o pai Kennedy, Joe, quando este lhe pediu dinheiro para a campanha do filho mais velho - e ele lho deu em abundância.
J. Edgar Hoover, o manda chuva do FBI, tinha toda aquela gente sob observação e vários telefones sob escuta.  E estava de posse de gravações de conversas entre a call girl Campbell e o presidente, e entre Campbell e Giancana.
Enquanto um Kennedy procurador geral finge perseguir o crime organizado, outro Kennedy serve-se desse mesmo crime organizado para ganhar as eleições; e quer servir-se outra vez dele para montar um golpe de Estado num país estrangeiro. Hoover, como se fosse um rapazinho de mãos limpas, considerou tudo isso, toda essa hipocrisia, revoltante. E não é de modas: escreve ao procurador Robert Kennedy e dá-lhe parte de quanto sabe daquelas ligações perigosas.


Hoover e o presidente Kennedy almoçam em Março de 1961. Hoover desbobina tudo o que sabe a respeito de Giancana, da Campbell e dele próprio, Jack Kennedy, presidente. O presidente deve ter embatucado, ou metido o rabinho entre as pernas.
No verão, o velho Joe Kennedy convida Sinatra e os outros membros do clã, os Rat Pack, para a vila que tinha na Riviera francesa.
 De um momento para o outro anula o convite com a desculpa de não haver quartos para todos.
O FBI carrega sobre Giancana. Mas Giancana pode revelar, entre outros, o segredo da conspiração cubana ao próprio procurador geral. E se Bobby Kennedy quisesse encontrar-se com ele bem sabia a quem se dirigir. A Sinatra.
Sente-se perseguido, Sam Giancana. E enerva-se.
- Como é? Devo estar a viver na Alemanha nazi e devo ser eu o maior judeu do país – diz aos capangas.
Em Dezembro de 61, em Palm Beach, a jogar golfe, o velho Joe Kennedy sofre uma hemorragia cerebral.

Com o velho e mafiosamente comprometido pai desaparecido de cena, os Kennedy sentem-se de mãos livres relativamente à Mafia – não esquecer que foi o velho Joe que os meteu naquela alhada só para ver o seu mais velho presidente.
Bobby Kennedy sente-se livre para se lançar, e agora a valer, numa cruzada contra o crime organizado. E prepara-se, claro, para morder a mão que lhe deu de comer, que permitiu que o irmão fosse eleito e que por conseguinte permitiu que ele ocupasse aquele cargo.
E vão 350 gangsters constituídos arguidos em 1962. Destes, 138 são condenados.

                      

O Wall Street Journal escreve: a maior acção jamais empreendida no país contra os gangsters, os vigaristas, os senhores do vício.
- Se um dia me apanharem na estrada por excesso de velocidade, tenho a certeza de que nenhum desses Kennedy me conhece - diz Giancana ao amigalhaço Johnny Rosselli.


Não valera de nada, no final de contas, a Giancana, reunir material de chantagem. Não lhe valera de nada prestar serviços e dar dinheiro aos Kennedy com o fito de os deixar em dívida perante a Mafia. Será que os Kennedy eram tão ou mais mafiosos do que a própria Mafia?
- Então, Sam? – fala Rosselli -, está na hora de lhes mostrares o teu lado mau.
 (Isto foram conversas ouvidas e gravadas pelo FBI).   
Sam Giancana nunca chegará a ser preso. Por um triz. É Bobby Kennedy quem o evita.
Na hora em que J. Edgar Hoover dá a ordem para a prisão de Giancana, Bobby Kennedy entra-lhe gabinete dentro e manda suspender tudo.
- Então?
- Não pode ser.
- Ora essa, porquê?
- Ele sabe demais.
Em Dezembro de 62, a call girl Judy Campbell declarou-se grávida de um dos Kennedy – vamos lá agora nós saber qual. E vai ter com Sam Giancana. Giancana alvitra-lhe que se case com ele – uma sugestão um bocado a atirar para o parvo. Mas a rapariga prefere abortar e Giancana leva-a ao Grant’s Hospital de Chicago. Foi no dia 28 de Janeiro de 1963.
O FBI começa a andar em cima dela. Querem saber quem é que ela conhece, com quem se dá. Ameaçam-na de a levar a depor perante um grande júri.
Mas bruscamente deixam-na em paz. Deixam de a interrogar. Nunca mais lhe falam em depor perante o grande júri. Diz ela que o Departamento de Justiça lá entendera que ela sabia demais e resolveram deixá-la de lado para acalmar os ânimos.
E pronto, com as coisas assim, como toda a gente sabe, a 22 de Novembro de 1963, o presidente John Kennedy é assassinado em Dallas. Com tantas trapalhadas na vida da família Kennedy a meter a Mafia, pode resultar difícil afirmar que a mesma Mafia, ainda por cima, e sobretudo, depois de desonrosamente traída nos seus compromissos com o clan Kennedy, nada tivesse que ver com o atentado.
O próprio Sinatra se perguntou se Giancana não estaria metido naquilo no tempo em que, muito interessado em clubes de strip tease, se tinha tornado amigo de um certo Jack Ruby – o homem que virá a assassinar Oswald, como se sabe –, Ruby que fora criado em Chicago e que só se fora instalar em Dallas por ordem da Mafia.
Meses antes do atentado ao presidente, por acaso, tivera lugar uma reunião mafiosa justamente em Dallas, numa boite chamada Carousel Club.
Um assistente de Jack Warner era até mais explícito: quem assassinou o presidente não fora outro senão Johnny Rosselli em pessoa. Outros testemunhos declararam que sim, que Rosselli andava a constituir uma equipa para esse fim.
Uma mulher que trabalhara com Jack Ruby, veio a declarar ter sido encarregada de transportar Rosselli e outro homem, um atirador especial vindo de Miami, até uma extremidade da Dealey Plaza. Ao aproximar do carro presidencial, o sniper de Miami disparara duas vezes, entregara a espingarda a Rosselli e desaparecera no meio da confusão. Essa mulher levara depois Rosselli para longe da cena do crime.


 Johnny Rosselli viria, anos mais tarde, a gabar-se de ter tido um papel no assassinato de Kennedy, e, fosse por isso, fosse por muitas outras aventuras, Johnny Rosselli desaparece.
Um membro da comissão de assassínios que investigou a morte de Kennedy, Robert Blakey, sustentará a implicação forte da Mafia na morte do presidente, de tal maneira a posição dele a vários títulos se tornara vulnerável a uma intervenção do crime organizado.
E foi a 23 de Abril de 1976 que chamaram Johnny Rosselli a depor no quadro da suspeitada conspiração para matar o presidente Kennedy.
Rosselli não apareceu.
Chamado novamente em Julho continuou ausente.
O Senado ordena então ao FBI uma investigação sobre o desaparecimento de Rosselli. Sem resultado. Nem rasto do homem.
E porque razão, entre tanto gangster mafioso, havia de calhar logo a Rosselli ter de ser ouvido sobre a morte de Kennedy?


Justamente pelo que se disse atrás. Alguém acusou Rosselli de, juntamente com um certo Charles Chuckie Nicoletti, ter disparado sobre o carro do presidente no fatal dia 22 de Novembro de 1963, na Dealey Plaza, em Dallas.
Mas era uma acusação fundada no vazio e sem o mínimo suporte probatório. E baseada nas recordações de um chefe de família mafiosa, Bill Bonanno: quando ocasionalmente detidos na mesma cela por um crime menor, Bonanno lembrava-se de ter conversado com Rosselli sobre o atentado a Kennedy, e lembrava-se de ter ouvido Rosselli gabar-se de também ter disparado em Dallas naquele dia.
E também havia o testemunho de um piloto da CIA, chamado Plumlee. No dia 23 de Novembro de 1963, Plumlee teria ido de avião buscar Rosselli à Florida para o levar a Dallas, a fim de fazer abortar a operação de assassinato do presidente Kennedy. Abortar, isso mesmo. Não seria a primeira vez que uma tentativa de eliminação de Kennedy seria abortada no último momento.
Pois segundo encartados analistas da vida americana, o principal responsável pela morte de Kennedy teria sido o chefe mafioso Carlos Marcello, da Louisiana. Sem contudo essa culpa eximir outros que terão dado uma mãozinha à operação: Johnny Rosselli e Santo Trafficante, entre eles.
Mas será preciso dizer que nesse mês de Novembro de 1963, antes de Dallas, Kennedy visitara outras cidades: Chicago e Tampa – na Florida. E por razões desconhecidas – minhas desconhecidas, pelo menos – os atentados previstos para uma e outra dessas cidades haviam sido abortados no último minuto.
Uma inquirição do Congresso, de 1979, concluíu que os mafiosos tinham os motivos, os meios e a oportunidade para liquidar o presidente, e Marcello, nessa época, passava por ser o mais poderoso dos chefes mafiosos da América.
Stephen Fox, um historiador, nota que se o velho Joe Kennedy não tivesse sempre tão ligado a gangsters e se Bobby não se tivesse encarniçado tanto contra a Mafia, o presidente nunca teria sido assassinado. Em tom grego, invocando o fatum, este ensaísta escreveria que o irmão matou o irmão e que o pai matou os dois filhos. ´
É das tais coisas, pois claro, se o meu avô tivesse rodas era uma camioneta; se o velho Joe não tivesse empenhado a Mafia na eleição do filho talvez o filho nunca tivesse chegado á presidência e nada disto tivesse acontecido e John Kennedy tivesse morrido na cama – se não estivesse ainda vivo.


Com Mafia ou sem Mafia que tivesse acontecido o atentado de Dallas, a verdade é que a morte de Kennedy caiu que nem ginjas aos interesses dos gangsters. Morto o irmão, Bobby suspende as inquirições contra a Mafia e pede a demissão no verão de 64. Para se candidatar ele mesmo à presidência.


 E toda a gente sabe o que aconteceu. Também ele viria a ser assassinado.




2 comentários:

  1. Sem sombra de dúvida, tudo boa gente... O mais triste é que, mesmo com outros detalhes a história repete-se por todo o mundo. O poder corrompe mesmo...

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  2. Os Estados Unidos da América convivem muito bem com a violência e com a morte. Às vezes até parece que se alimentam de ambas!


    E têm-nas EXPORTADO para todos os recantos do Planeta com assinalável sucesso...

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