quarta-feira, 11 de novembro de 2015


       A CONVERGÊNCIA,
              A CONVIVÊNCIA
                    E OS FANTASMAS



   
     Fantasmas, sim, a política portuguesa gosta de criar fantasmas, já que experimenta tantas dificuldades em criar realidades felizes.
    E convergência, sim, e convivência, e o portuguesíssimo “logo se vê”.
 
 
    A esquerda ainda não perdeu o vício de acreditar na política como uma instância moral que foi criada para mandar no dinheiro e determinar as prioridades de cada gasto. É a sua superioridade moral porque é o toque romântico da sua inferioridade perante certos problemas.
    A direita só acredita no dinheiro como a instância mais capaz de mandar na política e estabelecer prioridades, sempre as mesmas, maximização de lucros, tudo pelo capital, nada contra o capital. E nas tintas para a moral social, a ideologia, a solidariedade, tudo balelas, uma treta, como há anos o Jorge Jesus chamava ao fair play no futebol.
 
 
    E todas as diferenças se têm cavado ainda mais fundo nestes últimos dias de barroquismo político. Quase como nos tempos do PREC.
    Tem-se estado nestes últimos dias a forçar os limites da moral democrática, a querer arrombar a porta do parlamentarismo, e com base na última fantasmagoria que a direita criativa inventou, o arco da governabilidade. Toma que já almoçaste. Só este, aquele e aqueloutro podem ser mandados pelo dinheiro para actuar na política. E às malvas a vontade popular, outra treta que a gente inventou para os entreter de quatro em quatro anos, o que eles dizem não se escreve, ao que eles votam não se liga.
    Aos pés da esquerda solidária e ainda devota da politique d’abord levanta-se o estupor da realidade, um destino que nos marca a fogo e nos intimida, sermos devedores dos mais vorazes e desapiedados dos credores internacionais, os investidores, os accionistas, o mercado. E perante isso batatas, a esquerda das solidariedades e das razões morais não pode marchar enfeitada com os arcos, os balões e os manjericos da governabilidade.
 
 
    Se de convergência e convivência se fala neste exercício barroco, como é que um partido, PCP, para quem a política terá de viver sempre o inelutável destino de mandar no dinheiro, poderá, a la longue, depois da convergência, conviver com um PS que já deu o pontapé de saída na execução dos mandamentos neo-liberais de pôr o dinheiro a mandar na política – sim, no consulado daquele estranho ex-prisioneiro de Évora, um dos mais barrocos fantasmas dos últimos tempos da nossa vida pública?
    Outra coisa – que vem a dar no mesmo. O PCP está a readquirir estatuto, o estatuto de fantasma que congrega tanto os mais amenos afectos como os mais cortantes ódios ideológicos; o estatuto que teve faz quarenta e tal anos. O PCP torna ao estatuto de referencial do que se diz e do que se faz em política. O que se diz e se faz em política volta a ser aferido pela posição do PCP, pela condição de ser em benefício ou em prejuízo do PCP e da sua aberrante e fantasmática mania de pôr a política a mandar no dinheiro.
 
 
    E a surpresa rebentou nas mãos da direita. A direita do tempo do PREC ficou menos ideológica e na sua cegueira neo-liberal já não vê política, só vê dinheiro. A direita dos interesses, continuando ideologicamente trauliteira, descobre em 2015 que o fantasma do comunismo (do proletariado, das criancinhas, da reforma agrária) não foi exorcizado de vez e ainda arrasta tenebrosas correntes pelos corredores de S. Bento, ainda dissimula o seu manto branco nas roupas dos manifestantes da Intersindical e dos grevistas do Metro.
 
 
    A presente questão política da direita é a mesma de há 40 anos, e não é o PS, é o PCP, é o comunismo. Ainda!
A consolação que me resta destes dias é saber que o último acto político dessa praga da política portuguesa que tem sido o ditador de água doce que mora lá para Belém será o de dar posse a um governo de esquerda – apadrinhado por comunistas!
Se der.
Pois, são os tais sapos…
 
 
 

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