A JUSTA LUTA DO PATRONATO POR MELHORES
CONDIÇÕES DE VIDA
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Como
poderá um Estado desvitalizado, desacreditado pelos comandantes da finança e
tornado fraco, dinamizar meios de ajuda aos pobres? Cá está um ponto a favor da
justa luta do patronato.
Os pobres,
os tesos, os assalariados, ah, esses que não esperem muitas legislações a seu
favor. A-ca-bou-se!
A
mentalidade (e a realidade, por assim dizer) terceiro-mundista dos povos, é um
problema para os mercados. Mas também porque é que os recursos
mineiros destes países são sempre explorados por companhias estrangeiras – que
pagam as suas concessões de várias maneiras, é bem certo, mas que arrecadam
para os respectivos países e patrões proveitos fabulosos? Justamente para darem
uma contribuição para a luta do patronato contra os trabalhadores.
Os
investimentos e os investidores estrangeiros – patronato - se puderem escolher (e vão podendo com a
graça de Deus) , preferem trabalhar com regimes o menos democráticos possível,
senão de todo autoritários. Porquê? Ainda se pergunta? Porque são esses os que
melhor sabem lidar com a ingratidão e a revolta dos trabalhadores, a bem ou a
mal, e sem grandes remoques de consciência histórica, social ou moral.
Os
produtos dos países sub-desenvolvidos… serão os próprios governos a fixar-lhes
os preços? Claro que não. Os preços dos produtos dos países sub-desenvolvidos
exportadores são fixados por instâncias externas.
Os valores
morais, culturais e familiares dos países sub-desenvolvidos, por estas e por
outras, são esmagados por quem tem muito de seu. Porque diabo é que as
urbanizações nesses países são anárquicas? Porque é que aumenta o número de candidatos
à vagabundagem e ao sem-abriguismo? Porque é que campeia a delinquência? Porque
é que prolifera a prostituição, designadamente a infantil? Porque é que crescem
os sentimentos de revolta? Porque é que
é brutal a repressão?
A
transposição de sistemas de ensino, de formas de entretenimento e conceitos de cultura vem no seguimento deste caldinho. Faz tudo
parte do mesmo.
A
transposição de sistemas e de usos vai criar aos países menos desenvolvidos uma
sobrecarga de endividamento em materiais que os países ricos exportam para eles
como sinónimos de progresso e de desenvolvimento. E aqui se incluem os
armamentos e as bases militares.
Se existem
guerras no mundo, deixemos-nos de fantasias, já não será tanto por razões
políticas, territoriais, ou mesmo religiosas. Se essas guerras existem é porque
há gente influente e poderosa que com toda a justiça precisa de alargar os seus
mercados e escoar a sua produção de armas. E para vender as suas armas tem que
inventar e incentivar trinta-e-uns e conflitos artificiais (ou esgravatar nas
feridas naturais já existentes) de forma desencadear guerras, para as quais são
precisas as armas que esse patronato, para sobreviver condignamente, tem de
vender a bom preço.
Jean-François
Revel, famoso entendido nestas coisas, disse : denunciar o endividamento da América Latina como catástrofe caída do
céu é fazer vista grossa acerca do uso que os governos desses países fizeram
das gigantescas somas que receberam.
É a
globalização aquilo que constrange os estados a conceder prioridade mais alta à
economia.
É devido à
gula dos governos pelo investimento estrangeiro que a mundialização permite às
empresas transferir actividades e custos com um mínimo de inconvenientes. Antes
de abrirem uma fábrica em Quadrazais de Cima, o patronato internacional, como
moralmente lhe compete. quer saber como é isso da legislação do trabalho em
Quadrazais de Cima e como é aplicada.
Os
governos, ao quererem atraír a Quadrazais de Cima novas indústrias e novos
postos de trabalho, acordam concessões aos patrões de uma unidade de produção da General Motors ou da Adidas, e para isso desregulam o
trabalho, ou fazem-se desentendidos se esse patronato viola as leis existentes,
ou pura e simplesmente não aplicam os proteccionismos laborais em vigor no
país.
Dizem os
entendidos que há um novo direito público a instituir-se, o qual não passará de
um Direito Comercial privado, mas de amplitude mundial, reflectindo correlações
de forças e de interesses, interesses
que, está bem de ver, não são os dos trabalhadores nem dos candidatos a um
emprego. Era o que faltava.
Aquilo a
que os mais veteranos de nós na vida estavam habituados, e que lhes pareceu
sempre muito normal e muito lógico, foi que a economia e respectivas decisões
se subordinassem à política, ao interesse do Estado; a economia era instrumento
de uma política e não havia mais conversa. Parecia-nos lógico – mesmo que
pudessemos não concordar com a política, e visto que para mudar de modelo
económico a primeira coisa a fazer era mudar de política. Por isso havia, e há,
apesar de tudo, patrões anti-fascistas e anti-comunistas.
Porém,
hoje, as coisas viraram-se de pantanas e é a política que faz de pau mandado da
economia. Daí a crise da antiga ideia de Estado – e até de soberania.
Daí que os
patrões, muitos deles, os mais avançados de ideias, fossem anti-comunistas e
anti-fascistas. Isso cheirava-lhes a intervenção do Estado na liberdade dos
negócios – isso mesmo: a liberdade que hoje existe – extrema, total.
Porque se
começou a dizer que a hegemonia da política sobre o económico era coisa própria
de estados autoritários, de regimes de partido único – partido que era já parte
do próprio aparelho de Estado. A Itália, a Alemanha, fascistas e nazis, o
Portugal salazarista, a Espanha franquista, a União Soviética comunista: a
economia era planificada pela política, segundo objectivos políticos e de Estado
a atingir; o Estado intervinha e dizia o que se devia fabricar, vender,
consumir. De uma maneira ou de outra, mal ou bem, a missão do Estado era evitar
desequilíbrios e arritmias de crescimento e de produção, tendo em vista, repito,
mal ou bem, de uma maneira ou de outra – louvável ou perversamente, conforme a
ideia de cada um - , o bem comum, o interesse nacional e público.
Alguém se
preocupava com a dignidade das condições de vida do patronato? Ninguém
A economia
sufocava. Ou seja: o patronato acobardava-se e limitava-se a cumprir os ditames
do governo; o patronato era, pelo menos teoricamente, fiscalizado pelos
governos – veja-se lá se a Coca Cola entrou em Portugal no tempo de Salazar.
Patrões
fiscalizados pelo governo em nome, aí é que está, do colectivo nacional, do
interesse dos cidadãos. Pelo menos, repito, teoricamente, e segundo a concepção
que cada regime tinha do papel do Estado e do que seriam os interesses do
cidadão – os quais, já se vê, teriam de ser coincidentes com os do Estado,
senão metia pides e gestapos e coisas assim.
As
condições de vida de um patronato fiscalizado pelos estados autoritários,
totalitários ou fascistas, ou estalinistas, fortes, repressivos, eram
miseráveis, não deixando o patronato ganhar tanto e tão à barba longa como
seria de justiça ganhar no caso de esses estados serem democráticos, ditos de
direito e de livre iniciativa.
E a livre
iniciativa seria a económica e mais nenhuma. A iniciativa que era universal e
livre seria sem dúvida mais livre quanto mais dinheiro tivesse o patronato para investir e desenvolver negócios. O social? Bem…
(Lá vêm as
choraminguices com o Estado Providência, o Estado Social…)
O ponto
nevrálgico da luta do patronato contra a exploração dos trabalhadores é que as
ideias de confiança dos investidores e de Estado social ou de Estado
Providência não se podem ver uma à outra.
Governo
que queira conquistar ou manter o fogo sagrado da confiança dos investidores
deve esquecer e depressa as políticas sociais e/ou culturais.
São coisas
que mandam muita despesa e alguém, de uma forma ou de outra e mais dia menos dia, vai ter
de as pagar; alguém, ou, por melhor dizer, todos, incluindo o patronato investidor. O que é o cúmulo da injustiça social.
Políticas sociais e culturais de monta são
facadas no lucro do patronato investidor. E quanto a cultura, toda a
multinacional ou empresa global que se preze tem as suas verbas já destinadas
para o mecenato – para calar a boca aos intelectuais, que não fazem nada que dê
dinheiro mas que, se os deixarmos, chateiam muito e costumam ser os mais
impiedosos e jurados inimigos do patronato.
A
confiança do investidor será reforçada e muito mais efectiva a longo prazo se o
Orçamento de Estado estiver sob apertado controle, sem os impostos baixarem –
ou se não houver maneira de os iludir. Se estas simples coisas não acontecerem
num pequeno país, o grande investidor estrangeiro vai investir para outra
freguesia.
E por aqui
se pode aferir dos graus de independência e soberania das nações no presente
estado global da economia do mundo.
As
políticas sociais devem ser reformadas, diz o patronato investidor quando está no
limiar – ainda no limiar – da eventualidade de montar uma fábrica de água a
ferver em Unhais da Serra. E a reforma das políticas sociais na boca dele,
investidor, significa esquecê-las pouco a pouco e mui paulatinamente. Significa esquecer
de vez a ideia de que o Estado ainda poderá valer eficazmente aos desvalidos.
Significa abandonar a ideia de protecção social.
Que protecção social fica para o patronato? Isso é que é
moral, uns terem tudo e outros não terem nada? Nesta vida ou há moral, ou comem
todos, sendo que, não há volta a dar-lhe, uns terão de comer mais do que outros.
Um Estado
com um sistema muito estruturado de protecções sociais faz desconfiar o
patronato internacional, que pergunta logo a esse Estado, afinal como é?, amas mais os teus trabalhadores do que amas os meus
capitais?
Os
capitais do patronato internacional não se dão bem com os direitos dos
trabalhadores, são incompatíveis, o gato e o rato, o diabo e a cruz. Os lucros
do patronato mundial não suportam a ideia de ser, mesmo que infimamente,
repartidos pela mão de obra do país em que vão ser aplicados, ou de onde vão
ser esmifrados, em troca de nada, só porque sim, só porque há desempregados e
doentes e desgraçados. O patronato chega a considerar os trabalhadores de
certos países como privilegiados. E se formos a ver bem as coisas até são…
E para
acabar com as ideias atrasadas de política de protecção social ao trabalho, a
primeira bola a sair do saco é acabar de vez com o que o patronato mundial
chama de rigidez dos mercados de trabalho.
Flexibilidade, flexibilidade é que se precisa. E muita mobilidade na mão de
obra.
Os
trabalhadores ouvem a lenga-lenga e, ainda que a custo, começam a compreender.
E às vezes até a concordar. Flexibilidade no mercado de trabalho igual a…
trabalho nocturno, trabalho nem que seja ao fim de semana, horários móveis e
irregulares, grande pressão sobre a produtividade. E aumento consequente dos
sinais de stress.
O
patronato é a única realidade que pode tornar possível todas as outras.
É isso
que muito injustamente não há meio de se lhe reconhecer.
Se há quem
deva flexibilizar-se, então serão os trabalhadores. A mudança! A mudança! Mas
essa mitologia da mudança serve para os hábitos e para os direitos adquiridos
pelos trabalhadores. Não serve à lógica patronal. A lógica patronal é una, e imutável. De tudo o
que os trabalhadores têm conquistado com a sua tão cantada luta deverá ser
feita tábua rasa, no caso de o país querer mesmo o investimento estrangeiro, se
o país precisar como de pão para a boca de mostrar ao Banco Mundial e ao FMI
índices razoáveis de crescimento económico, com os prémios e as benesses a
serem-lhe acrescentadas lá mais para o futuro.
O
patronato só trabalha com o presente e para o presente. Ninguém pode garantir a
um patrão capitalista que haja futuro.
Estavamos
nós aqui em Portugal na pasmaceira, na santa paz dos sepulcros, sem sabermos da
missa que aí vinha a metade. E como síntese crítica da situação, até se dizia
em França, nos tempos de De Gaulle, tu dás-me o teu relógio e eu digo-te as
horas.
O
trabalhador globalizado começa (até que enfim!) a habituar-se à ordem do mundo
nesta entrada de novo milénio, começa a habituar-se a sair vencido das suas
lutas. E como sabe que a derrota vai ser certa, porque tudo está coberto com o
manto da democracia, já sabe que o melhor será nem lutar, porque se lutar
ficará à margem, e hoje todos queremos ser integrados num qualquer sistema,
numa ordem, seja como for e seja ela qual for. Ninguém, em democracia, quer ser
apanhado em falso e apontado como um apocalíptico. E o patronato marca mais
pontos na sua luta.
O
trabalhador lê ou ouve o discurso dos políticos da sua confiança, os
articulistas da sua preferência, os apresentadores de telejornais da sua
simpatia, os amigos do café que lhe dizem que isto agora é assim em todó lado,
e todos são unânimes no silêncio e no fingir que não estão a viver a sua vida no
fio da navalha, e então tudo lhe parece natural, é assim por todó lado,
correctíssimo, e… bom, não será por ele, trabalhador, que as coisas vão deixar
de ser o que são e de seguir o seu curso. E o curso natural das coisas e da
vida é responsabilidade do patronato.
Em
democracia e em sociedade de mercado uma qualidade é obrigatória a todo o
cidadão: não ser desmancha prazeres do festim da colectividade. Não ser
apontado como um trouble maker. O
patronato na sua luta conta com muitos cúmplices e cúmplices que podem muito.
Ser um
marginal ao sistema de vida laboral e económica instalado no mundo dito livre é
não alinhar com uma classe média intoxicada de informação e de desinformação e
que com a garantia de alguns mínimos de protecção social já fica satisfeita.
Ser um
marginal a este sistema é experimentar uma revolta mais profunda e estar ao
lado daqueles a quem a precaridade de trabalho e de vida empurrou para a
violência, violência que será brutal, justa
e friamente reprimida, não tenham dúvidas, por não levar em conta os
legítimos interesses do patronato.
Pode ser
interessante saber que, por exemplo, o Estado da Califórnia, paraíso americano
para o exercício de todas as liberdades, aprovou recentemente um orçamento em
que uma instituição foi mais beneficiada do que outras, incluindo universidades
de renome mundial.
E qual foi
a instituição privilegiada no bolo orçamental californiano, qual foi?
Foi a
instituição prisional.
O
mínimo dos mínimos da instituição
minimal que se quer seja o Estado é reprimir os marginais, os inconformistas,
os inadaptados, os apocalípticos. As despesas orçamentais com os organismos de
polícia, por isto e por aquilo, vem a
aumentar em todo o mundo… livre!
Em
economia de mercado, qual é a confiança que é mais compensador conquistar, a
confiança do povo ou a confiança mercados? Uma pergunta que todos os
governantes se põem. Ou se puseram noutros tempos. Uma interrogação histórica;
ou uma demanda que já teve a sua História de ser feita, que já teve, para ser
problemática, a sua oportunidade histórica. E que já não tem. Para um
governante moderno não haverá que hesitar: o que é preciso conquistar já nem só
em primeiro lugar, mas também em segundo, em terceiro e em quarto, é a
confiança dos mercados.
O governo
hábil na conquista da confiança dos mercados, perde a confiança dos povos. E
depois? É preciso salvaguardar a confiança dos mercados (do patronato) seja a
que preço for.
Mas que
figura fará um governo perante a desconfiança empedernida dos seus governados?
Ora… é
para o lado que ele se deita melhor…