AQUIETAI-VOS: É A REALIDADE
QUE SE ENGANA
É tudo mentira, afinal de contas, a começar pelos documentos
depositados na Biblioteca Nacional de Paris em 1956. Os adversários do Código Da Vinci proclamam-nos falsos. E
têm razão. Porque os próprios homens que os forjaram os declararam falsos. E os
principais adversários do Código Da Vinci
são os homens da Igreja católica, naturalmente, com especial relevo para os
senhores da Opus Dei, que não puderam proibir o Código da Vinci, mas que na época saíram de vários modos à estacada.
Não vos inquieteis, é a realidade que se engana…
No máximo, este “código” teve a utilidade de inspirar outras
maneiras de ver – e tão falsas e tão verdadeiras, e tão prováveis e tão
improváveis, como as católicas ortodoxas - aos não sei quantos milhões (uma data
deles) que o leram em todo o mundo.
E com respeito a Monsieur Pierre Plantard de Saint Clair, dito grão-mestre
do Priorado de Sião?
Primeiro, era o mais lídimo descendente da estirpe dos merovíngios,
mas por fim já não era. Morreu no ano 2000 – nem de propósito.
Morreu? Muita calma, no entanto, ao dizer-se que M. Plantard morreu
no ano 2000. É que o anúncio da morte dele aparece em Junho de 2000. Mas pouco
depois, os curiosos destas coisas do Segredo e da iniciática vão certificar-se
e descobrem que, ao contrário do que a família anunciara, a morte de Pierre
Plantard ocorrera em Fevereiro, no dia 3. Como é isto?
Os actuais superiores do Priorado explicam-se. Nos últimos anos a
situação do Priorado e de M. Plantard esteve sujeita a fortes tensões, ameaças,
pressões, demandas. E havia uma coisa que Plantard quereria evitar a todo o
custo: acabar os dias como outros seus irmãos mais notórios: envenenado.
Tomaram-se então providências e elaboraram-se estratégias. Em conclusão: não se
sabe de Pierre Plantard é vivo ou morto.
Plantard nascera em Paris em 1920 e os pais, um mordomo e uma
costureira, tinham-lhe dado o nome de Pierre Athanase Marie Plantard. Quem hoje
lhe escreve na Net o pefil di-lo anti-semita e anti-maçónico. Admirador de
Pétain durante a ocupação, a quem escreveu uma carta em Dezembro de 1940,
advertindo quanto a uma conspiração judeu-maçónica.
Não sei o que se passou, mas as autoridades de Vichy e a Gestapo
investigaram e o resultado foi M. Plantard ter ido dar com os costados na
prisão de Fresnes por 4 mesinhos. Editou jornais com artigos escritos
unicamente por ele próprio e assinados com diversos nomes, para parecerem
muitos os colaboradores. Um relatório das autoridades francesas diz dele que é um jovem pretensioso que se jacta de ter
ligações com grupos de influência e homens políticos, mais ou menos fictícios,
mas que pretende essencialmente atrair as atenções sobre a sua pessoa e parecer
mais importante do que de facto é.
Condenado e preso seis meses em 1953 por abuso de confiança e
atentado à propriedade alheia. Interessa-se pelos mitos que envolvem Rennes-Le-Chateau. Em 1956 funda uma
pequena associação chamada Priorado de Sião e regista-a oficialmente. É
condenado por fraude a um ano de prisão – entre 1956 e 57. Forma uns comités de
segurança pública já no tempo de De Gaulle. Edita um jornal, Circuit, de conteúdos
metafísico-esotéricos. Em 1964 volta às andanças do Priorado de Sião e
arroga-se a descendência directa de Dagoberto II, o rei merovíngio assassinado.
De sociedade com outros, forja pergaminhos antiquíssimos, cifrados, falsos,
onde inventa mistérios e genealogias. Um autor de histórias de mistério dá corpo
literário às invenções de Plantard. Uma das histórias inventadas por ele é a do
Padre Bérenger Sauniére que contei como se fosse verdade há uns posts atrás.
Quer dizer… não será completamente verdade, mas alguma verdade pode
haver. Parece certo que o padre Sauniére achou pergaminhos na igreja de Santa Maria
Madalena em Rennes-Le-Château. Mas deixou-se cair um véu espesso sobre a
natureza e o conteúdo desses pergaminhos. Eles podem nada ter a ver com o que
foi publicitado.
O que parece também ter sido verdade é Sauniére ter sido usado por
redes secretas como peão inocente num jogo mais complicado e perigoso.
Há a possibilidade de esses documentos integrarem um corpo de
mensagens codificadas entre as redes operacionais do Priorado.
E depois… em Rennes-Le-Château, no tempo do padre Sauniére, alguém
montou uma oficina de falsificação de documentos antigos, mais tarde
transaccionados como autênticos.
Regressando a Pierre Plantard… ao longo dos anos 60 e 70, Plantard
vai forjando documentos falsos. Inventa a lista de grão-mestres do suposto
Priorado de Sião onde aparecem os da vincis, os botticellis, os newtons e os
debussys. Há muita gente a acreditar, o que o encoraja. Em 1984, todavia,
alguém, um investigador, lhe descobre a careca e lhe esgravata o passado.
Plantard resigna solenemente da sua investidura como grão-mestre do Priorado –
o que dá para rir, é claro. Mesmo assim, em 1985 deposita na Biblioteca
Nacional de Paris o último documento secreto.

Em 1989 abre em Rennes-Le-Château o museu Sauniére, o que encoraja Plantard
a fazer um comeback às lides
mistéricas com uma nova versão da vida e feitos do Priorado de Sião através de
um jornalzinho denominado Vaincre,
com novas aldrabices e novas listas de grão mestres, arguindo que as anteriores
eram falsificações forjadas por um certo Phillipe Toscan du Plantier quando
estava enfrascado em LSD.
Afinal, o Priorado de Sião tinha sido fundado em Rennes-Le-Château
em 1681 e tinham sido descobertos documentos secretos em Barcelona.
Plantard continuava a afirmar-se descendente de Dagoberto II mas
desta vez indirecto, já que o mais directo e verdadeiro descendente do rei
merovíngio era o arquiduque Otto de Habsburgo.

E tudo isto, a favor ou contra, de um lado ou do outro, pode ser
verdade, meia verdade, ou completa vigarice. Assumindo as teorias de
conspiração, o livro de Dan Brown pode ter aparecido quando apareceu por acaso,
por razões puramente pessoais do seu autor. Mas também pode ter feito parte de
um plano. Porquê, virada a página do milénio, voltar a pôr nas bocas do mundo
as questões da descendência de Cristo, de Maria Madalena, dos merovíngios, de
Rennes-Le-Château, de Béregner Sauinére, e do eventual papel de uma sociedade
secreta no destino do mundo - e logo um livro de baixa valia literária, mas
descaradamente concebido para ser rapidamente apreciado e para vender, vender
muito, milhões e milhões por todo o mundo? É que aqui pode andar coisa…
Porque neste interim de trapalhadas e realidades, houve mortos e
desaparecidos – eventualmente assassínios e as coisas podem até ser mais sérias
do que parecem. Neste interim pode haver uma 5ª Coluna a soprar notícias falsas
aos jornais. E não quaisquer notícias. Exactamente notícias que pretendem
desacreditar alguém, ou alguma coisa. O quê? A Igreja de Roma? O papado?
Foi noticiado, por exemplo, por alturas da publicação do livro, e com
destaque, o desacordo da Santa Sé pela presença no Santuário de Fátima de gente
de outras religiões; garantiu-se que o Vaticano fazia tenções de controlar o
Santuário, e afastar alguns responsáveis.
Foi noticiado que o Vaticano proibia a execução nas igrejas de música
não litúrgica…

Tais notícias apelavam descaradamente à revolta contra o poder de
Roma e contra o conservadorismo e autoritarismo do papado.
Só que… as notícias eram
falsas.
E provavelmente em toda esta confusão de disfarces, falsificações,
confusões, ambiguidades… terá havido mãozinha de alguns serviços secretos para
confundir mais os espíritos bem intencionados e desprevenidos que ainda
pudessem crer que haveria alguma verdade ou algum misticismo em tudo isto…
Mas para que servirá hoje, na era da informação, uma sociedade
secreta, designadamente o Priorado de Sião? E responde-se: a ordem sempre (alegadamente)
contou entre os seus membros com gente poderosa e influente, e através dela
foram feitos negócios e traficados certos interesses. Mas depois reafirma-se
que o Priorado não persegue objectivos políticos ou financeiros. Então persegue
que objectivos?

Argumentam os actuais superiores que o grande público não interessa
aos fins do Priorado. Os documentos revelados por Plantard aos autores
ingleses, sendo falsos, podem todavia ter sido inspirados de perto pelos
verdadeiros.
E no fim das contas, o que dá a ideia é de que priorados ele deve
haver muitos, uns verdadeiros (mas disfarçados) e outros totalmente falsos, e
tão falsos que se confundem facilmente com os verdadeiros e podem fazer com que
os verdadeiros passem por falsos…
Vá-se lá ser prior numa freguesia destas.
A confusão é total, pelo menos para o vulgo, e tão total ela é que
parece estéril falar destas coisas a sério. Ou mais: poder-se tomar a sério
toda a caterva de livros que se escreveram e escrevem acerca deste assunto,
incluindo o Código da Vinci, ou mesmo
o Sangue de Cristo e o Santo Graal.


O caso é que estas matérias vendem. E quanto mais intrincada for a
trama, melhor. Nalguma parte do mundo alguém se deve estar a divertir à grande
à nossa custa… à custa de quem comprou os livros e acreditou em tudo…


Mas também estes livros podem acrescentar ao grande público e ao
homem da rua alguma esperança de que alguma coisa de grande possa estar para
acontecer, alguma transformação num mundo de regras incríveis que parece mais
irracional e falsificado do que os conteúdos destas histórias. Irracional por
irracional, vigarice por vigarice, o vulgo prefere o irracional e a possível
vigarice romanesca e impossível de provar ao concreto das suas vidas vividas
entre casa, trabalho, casa, gozado, roubado, humilhado e ofendido… e
desiludido… com o emprego, com a economia, com os “seus” políticos, com a
igreja, com o futebol, com a vida…
Para os homens que séria ou comicamente estão por detrás destes
segredos e destas ordens às vezes secretas outras vezes facilmente visíveis, o
ano de 2003 foi um ano fatídico. O apogeu do Priorado de Sião – e seja esse
apogeu o que for – foi atingido. Talvez 2003 fosse ano propício a revelações.
Talvez não seja por acaso que o Código da
Vinci aparece no momento em que aparece, faz dez anos.
Pois é. Tudo pode ser e tudo pode não ser. E como diz o outro: o
populacho, à força de ter deixado de acreditar no que quer que fosse, já começa
a acreditar em tudo. Talvez o Código da
Vinci contenha a revelação – devidamente codificada, claro está, para nos
confundir ainda mais.
Depressa, depressinha, amigos iniciados, vá lá… o segredo. É uma
grave questão de moral. Depressinha. E tudo muito bem explicadinho e muito
clarinho para eu perceber, an? De contrário, terei de alinhar com a Igreja,
terei de pensar que tudo isto, toda esta coisa do gnosticismo e do iniciático
não passa de uma grande aldrabice e o melhor será fiar-me na palavra dos padres
e dar todo o crédito às refutações da Igreja ao que os autores rosacrucianos ou
gnósticos nos fazem crer que tem fundamento histórico…
Por amor da santa, revelem-me, revelem-me alguma coisa, o mundo e
eu precisamos que alguém nos revele alguma coisa para termos alguma fé e nos
convencermos de que as realidades presentes são transitórias e de que no nosso
destino há um desígnio que transcende a desoladora mediocridade em que a vida
presente mergulhou. Revelem-me qualquer
coisa, por favor. E com urgência. E de preferência qualquer coisa de belo…