E DAQUELA VEZ, NOS LOUCOS ANOS
20 EM QUE O CUNHADO ARRUINADO DE STRAVINSKI
SE FEZ À VIDA GRAÇAS A UMA IDEIA DE RUBINSTEIN?
Bem, já agora vá lá mais esta
com Rubinstein e Stravinski e os loucos anos 20.
É assim: um dia, em Nova York,
Rubinstein regressa de uma tournée a
Cincinnati, chega à recepção do seu Biltmore Hotel e tem uma encomenda à espera
dele.
Não, a encomenda não era a
amante, a Gabriella Besanzoni acabada de chegar para lhe fazer uma surpresa. A
encomenda era uma partitura musical. Uma nova composição. O remetente morava na
Suiça. Chamava-se Igor Stravinski.
Há que tempos que Stravinski prometera
a Rubinstein escrever uma peça de piano em homenagem a ele, dedicada a ele. E
aí estava ela. Piano Rag Music. Enviava-lhe o manuscrito. Era a “primeira peça realmente
para piano” de Stravinski. Rubinstein ficou desvanecido.
Aproveitando a partida da
Besanzoni, e agora com mais tempo para dedicar a si próprio, Rubinstein vai
para o piano e começa a ler a partitura.
E pronto. Sabendo que era uma
peça especificamente escrita para piano, Rubinstein não deixou por isso de
experimentar as sólitas sensações que a música de Stravinski de hábito lhe
transmitiam, ainda que usando a escrita pianistica.
Bom, mas aquilo era mais um
exercício de percussão; nada tinha a ver com alguma rag music nem com nenhuma outra música, de acordo com as concepções
provavelmente passadistas e empedernidamente pianisticas que eram as de
Rubinstein. Arthur sentia-se lisonjeado, ufano, com a distinção, mas também ficava
decepcionado.
Daí a tempos, Rubinstein
regressa a Paris. Vai para o Hotel Régina. Abre a janela do quarto de dá de
caras com uma estátua de Joana d’Arc em tons dourados. Paris. Loucos anos 20.
E encontra, evidentemente, Stravinski.
Stravinski está-lhe grato. Quando andara muito nas lonas financeiramente,
Rubinstein organizara na América uma subscrição para valer ao grande génio da
música com problemas de tesouraria e conseguira uns trocos muito jeitosos a que
Stravinski chamou um figo. Talvez derivasse daí a dedicatória do Piano Rag Music.
Também Stravinski estava de
novo em Paris. E de novo tesinho que nem um carapau. Deixara a família na Suiça
e andava outra vez com uma mão atrás e outra adiante, à procura de Diaghilev.
- Então, conta-me lá, chegaste a
incluir nos teus concertos a minha Piano Rag Music?
- Meu caro Igor, vou ser muito
franco contigo… sinto-me muito honrado e orgulhoso com a tua atitude de me
dedicares a peça. Mas não te podes esquecer de uma coisa, rapaz: eu ainda sou
um pianista à moda antiga, um pianista da velha guarda…
- Que é que tu queres dizer…
- A tua peça está escrita para
percussão, ouviste?, e não para o meu estilo de pianismo.
Stravinski não gostou da
conversa de Rubinstein.
- A verdade é que não compreendeste
aquela música. Foi isso e mais nada. Não percebeste patavina do que eu te
mandei. Mas olha, eu vou-ta tocar agora mesmo e vais ver se não começas a
perceber tudo com clareza.
E Stravinski vai para o piano.Vai
para o piano e desata a martelar no teclado. E quanto mais ele martelava mais
Rubinstein detestava aquela música. E perante o desconsolo do amigo, Stravinski
foi mesmo aos arames.
- Mas ouve lá, ó Arthur, tu ainda andas
convencido, nos tempos que correm, que és capaz de fazer cantar o piano? É uma
ilusão que te meteram na cabeça. Andas enganado, filho! O piano não passa de um
instrumento utilitário que a mim só soa como um instrumento de percussão.
- Julgo que não sabes, ou ainda não
percebeste, Igor, que o grande público não só não compreende como não gosta…
an?… não gosta da tua música nem com molho de escabeche. Ainda não topaste
isso? As tuas orquestrações são demasiado pesadas, demasiado ruidosas para o
público. Já não te lembras do que se passou na estreia do teu Sacre du
Printemps? E olha, por alguma razão, misteriosa, aliás, quando toquei a tua
música ao piano ela ficou clara para o público e público até parecia que
começava a gostar dela.
Stravinski desata a rir.
- O que tu estás a dizer é um disparate
pegado!
Rubinstein levanta-se, vai para o piano
e começa a tocar um fragmento de Petrushka.
- Ouve, achas que isto soa a percussão?
Ou soa apenas como música?
Stravinski (agora apaziguado e
profissional) reflectiu:
- Mas como é que tu consegues fazer
soar assim os graves? Tens alguma maneira especial de usar o pedal?
- Claro, homem, o meu pé encontra
rapidamente a vibração precisa das notas graves, o que me deixa livre para para
modelar as harmonias no registo agudo. Sabes, Igor, o piano que tu tanto
odeias, pode fazer coisas que nem te passam pela cabeça.
Stravinski começou a entusiasmar-se.
- Está dito! - grita Stravinski. - Vou
escrever para ti uma sonata a partir do material de Petrushka.
E depois abraçaram-se e beijaram-se os
dois com muita amizade e alegria.
E foram jantar. À pala de Rubinstein,
já se vê.
E conversaram toda a noite acerca da forma como cada um tinha vivido
e passado os terrores do tempo da guerra, a 1ª Guerra.
- Tenho a impressão de que vais gostar
de uma coisa que eu fiz de sociedade com um escritor suiço chamado Ramuz…
-Como é que se chama?
- A História do Soldado. Mas também fiz
outra coisa, uma espécie de música para o ritual russo do casamento. As Bodas.
Acompanhada por pianos…
- Oh diabo… faço ideia…
- Exactamente. Em forma de percussão! E
olha lá… e tu… com respeito a papel?
- Bem, nas minhas tournées pelas
américas, fiz na verdade muito dinheiro…
- Pois é. Vocês, pianistas são uns
chupistas do piorio…
- Uns chupistas do piorio? Ora essa!
- Então não são? Ficam milionários de
um dia para o outro à custa das músicas que escreveram para vocês um… um Mozart
e um Schubert sem vintém…um Schumann meio louco, um Chopin tuberculoso… um
Beethoven que sofria do fígado…
- Nessa parte tens razão, Igor. Os
pianistas são uma espécie de vampiros que sugam o sangue de gigantes geniais.
E de facto, a sonata composta por
Stravinski sobre a música de Petrushka viu a luz do dia.
Rubinstein está com a partitura aberta
em frente dos olhos. Ao meu amigo e grande artista, Arthur, com toda a amizade, Igor Stravinski.
Três movimentos: Dança Russa; Em Casa de Petrushka; A Semana Gorda.
Brilhante transcrição, segundo
Rubinstein. Podia ouvir-se uma orquestra inteira naquelas duas linhas de música
para piano extremamente difíceis de executar.
Nesse entremeio, chega a Paris um
cunhado de Stravinski, um certo senhor Bieliankin. Vinha também completamente
liso com respeito a dinheiro. Precisava desesperadamente de começar vida em
Paris, dado que os seus bens haviam sido confiscados pelas novas autoridades
comunistas.
Rubinstein faz certos reparos a
Stravinski acerca da escrita pianistica de Petrushka. Certas passagens que, na opinião pianistica dele retardavam
por demais os efeitos de progressão dinâmica da obra.
- Está bem, pronto, Arthur, mas agora
não me chateies mais com as tuas críticas e com as tuas esquisitices
pianísticas. Olha, podes tocar isso da maneira que entenderes que para mim é
igual ao quilómetro. Não tenho nada a ver com isso. A partir daqui é com o
intérprete.
- Ai é?
- Sim, rapaz, dou-te carta branca. E já
agora, também gostava que falasses com
aquele meu cunhado que chegou há dias da Polónia com aquele problema da falta
de dinheiro. Talvez tu pudesses fazer alguma coisa por ele...
E já que tinha a carta branca do autor
para interpretar pianisticamente o Petrushka, Rubinstein tirou partido disso. Com um senão. Nunca
haveria de gravar a peça em disco. Diz que conhecia de ginjeira o seu amigo
Igor. Por conseguinte, sabia muito bem que, apenas gravasse a peça para a
posteridade, mais tarde ou mais cedo Stravinki haveria de se sair com alguma,
ou, por exemplo, proclamar ao mundo: Rubinstein, ao tocar a minha Sonata Petrushka mais não
fez do que uma traição às intenções do autor.
O Sr. Biliankin, o dito cunhado de
Stravinski, homem de longas barbas grisalhas, pareceu a Rubinstein um velho
pope da igreja ortodoxa russa.
Era preciso encontrar um meio com que o
sr. Bieliankin pudesse governar a vida em Paris. Rubinstein tinha bons
conhecimentos no mundo das artes e do espectáculo, mas… bom, com aquele
aspecto, pensou, dificilmente poderia pensar em empregá-lo como dançarino
nalgum night club. Mas enfim, teria o cunhado de Stravinski algum talento,
ainda que pequeno, ou alguma relação com a actividade musical? Não.
- Nesse caso, amigo, Bieliankin,
torna-se muito difícil ajudá-lo, sabe? A vida está muito má…
Pois não, o sr, Bieliankin não tinha o
menor interesse por coisas artísticas.
- Ó Igor, não sei o que é que hei-de
fazer ao teu cunhado. Oiça lá, amigo, Bieliankin, diga-me cá uma coisa, o que é
que mais gosta de fazer na vida por si abaixo? Alguma profissão, alguma
ocupação em particular?
- Sabe, sr. Arthur, eu sou um filho da
terra, toda a vida tive terras, sempre vivi das minhas terras, nunca tive
profissão propriamente, isto é…
- Ó homem, mas não há nada que você
tenho gosto em fazer… nada que saiba fazer realmente bem…
- Eu? Bem, eu adoro cozinhar. Só se for
isso…
- E oiça lá, você seria menino para
abrir um restaurante e explorá-lo?
- Eu? Toda a vida sonhei ser dono de um
restaurante!
- Então porque é que o amigo não abre
um restaurante russo?
- Aqui, em Paris?
- Não, homem, aqui não. Já cá há
vários.
- Então não sei.
- Estou cá a pensar em Biarritz. Sabe
você que Biarritz está assim de gente
podre de rica e de gourmets. A questão é conseguir um bom sítio, com boas
vistas e abrir um restaurante típico. Comida genuinamente russa. Valeu? E que
possa estar aberto até às quinhentas. Com música ao vivo para acompanhar a
refeição, acordeão, balalaika e essas coisas. Olhe, esta ideia é a melhor ajuda
que lhe possa dar.
O sr. Bieliankin começou a sentir
suores frios, tal era a satisfação.
- Mas ó sr. Arthur, e onde é que eu vou
desencantar o papel para arrancar com esse empreendimento?
- Faça-se à vida, homem,
desenrasque-se…
Rubinstein conhecia em Paris dois ou
três russos que tinham casado com mulheres riquíssimas…
E não foram precisos muitos dias para
se arranjarem uns quantos investidores.
Quando tudo estivesse arranjado,
Rubinstein aconselhava um grande jantar de inauguração, uma coisa à séria e em
grande.
- Trago-lhe os meus amigos de Biarritz
e de San Sebastian. Trago-lhe alguns dos meus amigos de Paris que conhecem os
restaurantes russos da Rue Pigalle. Arranjo-lhe uns vinte convidados, a nata da
sociedade parisiense e mais uns quantos senhores aristocratas espanhóis que
adoram estas coisas… e ainda uma quantidade de gourmets profissionais. O que é
preciso, amigo Bieliankin é que a comida seja boa e autenticamente russa. E já
agora, peço-lhe licença para colaborar na feitura do menú para essa noite de
inauguração. Estas coisas são muito sérias, amigo Bieliankin.
- Pois acredito, sr. Arthur. Mas então,
o que é que há-de ser para o jantar do dia da inauguração?
- Vamos lá ver… entrar com blinis. E com caviar. Mas quero o caviar comprimido, à pressão.Os verdadeiros connoiseurs preferem-no ao
caviar fresco, que por vezes vem demasiado salgado
- Acompanha com vodka, não,
sr. Arthur?
- Claro.
- Smirnovska! Smirnovska!
- Borscht! Autêntico borscht
russo...
- E o vinho?
- Um Bordeaux de uma
interessante colheita não ficará mal.
- Oh, Bordeaux
- Não concordo com uma coisa…
- Qual?
- Para mim, a entrada ideal
seria um shaslik do Cáucaso, apresentado num espeto em brasa com o competente
arrozinho à russa.
- Se quer que lhe diga, amigo Arthur, a
úncia entrada digna de um jantar deste calibre seria o belo leitão assado… e o
resto é conversa…
- Odeio esse prato.
- Não me diga!
- Ainda me lembro na Rússia e
na Polónia… os talhos põem na montra, nuns grandes pratos, as cabeças dos
pobres leitões. Sempre que passava por um desses talhos fechava os olhos para
não ter essa visão bárbara, amigo Bieliankin…
- Não, sr. Arthur, temos que ter
leitão… temos que ter. Temos que ter! Eu sou um verdadeiro mestre a
prepará-los, amigo Arthur.
- Shaslik, amigo Bieliankin, shaslik…
- Olhe, para já, isso nem é
bem russo…
- Então o que é?
- É caucasiano.
- Ora…
- Um prato do Cáucaso, e digo-lhe,
ainda por cima de muito mau gosto…
E como o cozinheiro era o
cunhado do Stravinski, Rubinstein achou que era como o outro e deixou cair a
ideia dele. Mas falou dos queijos. Como iria ser a tábua dos queijos. O outro
pôs-se a rir.
- De que é que você se está a rir?
- Amigo e senhor Arthur… na
nossa boa mesa genuinamente russa não costumamos pôr nada que cheire mal. Mas
olhe, proponho uma sobremesa. Um preparado gelado à base de rum. Uma
especialidade russa.
- Rum? Uma especialidade
russa? Não me faça rir que eu estou cheio de cieiro, amigo Bieliankin… rum, uma
especialidade russa…
Já se viu que o próprio
Stravinski não é mencionado nestas cenas por Rubinstein. Devia estar para lá a
compor as suas músicas e a ver se sacava algum de alguém e a borrifar-se para o
restaurante do cunhado.
- Oiça, essa do rum e do ice-cream, sr.
Bieliankin, estou farto de comer disso nos restaurantes franceses mais chauvinistas…
E ainda por cima, era uma
sobremesa que o russo insistia fosse acompanhada por um champanhe de boa marca.
Chega o dia da inauguração.
Nesse dia, à hora do requintadíssimo jantar russo, apresentou-se à mesa o tout Paris, o
tout Biarritz, o tout San Sebastian, o tout Madrid, o tout tudo o que Rubisntein esgravatou nas suas mundaníssimas
relações.
Um sucesso. Um sucesso que
Rubinstein declara ter ultrapassado de largo as suas melhores expectativas. A gente era tanta que o cunhado de
Stravinski se viu forçado a servir doses mais pequenas do que as previstas,
quando não, a comida não chegava para tantas bocas. Mas Rubinstein ficou
especialmente contente com uma coisa: metade dos convidados recusaram comer o
leitão, com a elegante desculpa de já terem enchido a malvada de caviar, blinis
e borschts.
Lá se arranjou um acordeonista
baratucho e um homenzito de cabeça rapada que tocava umas músicas russas
aciganadas com um ar tão triste que arrancava lancinantes bravos aos mais
macambúzios dos bebedores de vodka.
Stravinski não estava na
festa.
Diz Rubinstein, não sei com
quanta verdade, que Stravinski não apareceu por uma única razão: ao autor do Sacre du Printemps não interessava ser
cumprimentado entre leitões. Assados pelo seu próprio cunhado, ainda por cima.
No dia seguinte, uma surpresa
pouco agradável aguardava Rubinstein.
O sr. Bieliankin não foi de
modas e apresentou a Rubinstein a conta do jantar daquela rapaziada toda. Conta
cujo montante, não era nada, ultrapassava todo o dinheiro que Rubinstein tinha
consigo (não esquecer pormenor importante: não havia multibanco). Para pagar,
Rubinstein teve que vender à pressa alguns dos títulos argentinos que tinha, o
que demandou complicadas operações bancárias entre Biarritz, Paris e Buenos
Aires. E não esquecer outro pormenor importante: não havia telemóveis nem
internetes.
Vá lá que o Bieliankin lhe
cobrasse os custos simples dos jantares, ao preço de fábrica, vamos dizer
assim. Mas não. O sr. Bieliankin, cunhado de Stravinski, que, como digo,
acabava de se fazer à vida numa época e num lugar difíceis com o apoio de
Rubinstein e respectivos amigos, apresentava-lhe uma conta na base dos preços
que o próprio Rubinstein, inocentemente, o aconselhara a sobrecarregar quando
tivesse uma clientela de ricos. Ora isto para um judeu, meus amigos… devem ser
facadas.
E para ajudar o pai que é
velho, metade do preço cobrado pelo Bieliankin a Rubinstein era dos leitões que
Rubinstein tanto odiava.
- Ah pois é, amigo Arthur, pois
apresento-lhe a conta. Se você soubesse o trabalhão que eu tive com tudo isto!
- grita-lhe o Bieliankin.
- Os leitões é que eu…
- Os leitões? Se você soubesse
a estafa que me deu arranjar estes leitões todos… tive que ir a Bordeaux… tive
que ir a Toulouse… por um pouco não os encomendava directamente de Paris, veja
lá bem, sr. Arthur…
Arthur sabia era que tinha ali
uma conta calada para pagar.
- O sr. Arthur sabe lá o dinheirão que
eu gastei em telefonemas! E ainda me diz que a brincadeira lhe saíu cara… com
franqueza, sr. Arthur…
O que é que eu hei-de fazer à
minha vida, suspirou o bom do Arthur, se me vim meter com um cínico, com um
ingrato… ainda por cima adepto de leitões assados…
La Boîte Russe. Foi como se ficou a chamar a casa.
Daí a uns tempos o Bieliankin
instalou-lhe um salão de baile no andar de cima. Mas Rubinstein nunca contou a
Stravinski como é que tudo tinha acabado. Stravinski só ouviu contar uma parte
da história, e então aí ficou muito orgulhoso das façanhas culinárias e do
talento financeiro do seu inefável cunhado.
Foi por essa altura que
Rubinstein frequentou muito o atelier
do seu amigo Picasso, que passava o tempo a fazer-lhe queixas da mulher, Olga
Kochlova, porque ela lhe fazia a vida num inferno. Sim, esse, Picasso, que num
dia desses levou um milionário americano lá ao atelier e lhe mostrou algumas das suas obras-primas. O americano
fixou-se numa das telas, olhou, interessou-se, tornou a olhar, e perguntou ao
mestre:
- Mestre, diga-me lá, o que é
que esta tela representa?
Picasso, muito sério, também
muito concentrado na obra e muito intelectualmente, responde:
- Duzentos mil dólares.
Stravinski, ao contrário do
cunhado, continuava a tinir, sem cheta. Continuava a encontrar-se com
Rubinstein.
- Tu é que a levas direita, Arthur.
Tocas meia dúziazita de números ao piano e fartas-te de ganhar dinheiro…
- Ó homem, vê se te calas que
eu já não tenho paciência para ouvir essa conversa, an? Eu tenho alguma culpa
de que tu toques piano tão abominavelmente? Sou eu que tenho culpa, querem ver…
mas porque é que tu não compões uma coisa fácil, um concerto para piano e
orquestra ou qualquer coisa assim que esteja ao teu alcance e não te pões a
tocá-lo em público por esse mundo fora?
Um conselho precioso que não caíu em saco roto. Em poucas semanas, Stravinski tinha
pronto o seu Concerto para Piano e Instrumentos de Sopro.
E ganhou bom dinheiro com ele.
Com ele e com a sua nova carreira de pianista que corre mundo a tocar
exclusivamente as próprias obras – as únicas que sabia tocar.
Mais tarde, seria chefe de
orquestra. Que só dirigia as próprias obras. Mas que ganhava bom dinheiro.
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