COISAS
- Responde-me cá, meu rapaz, sabes que
isto é um espaço quadrado?
–
Sei.
- O espaço quadrado é aquele que tem os quatro lados todos iguais?
– É.
– E estas outras linhas tiradas pelo meio não são também iguais?
– Sim.
– Um espaço deste género não pode ser
maior ou menor?
- Sem dúvida.
- Se este lado mede dois pés, e este lado o mesmo, quantos pés
terá ao todo? Espera… considera a coisa deste modo: se este lado medisse dois
pés e aquele apenas um pé, não é verdade que o espaço mediria uma vez dois pés?
- Sim.
– Mas como este lado mede também dois pés, isso não faz duas
vezes dois?
– De facto, faz.
– Então, o espaço é igual a duas vezes
dois pés.
– Claro.
– Quanto é duas vezes dois pés?
– Ó Sócrates, eu acho que são quatro
– Vês tu, Ménon, que eu nada lhe
ensino e que eu apenas o interrogo?
As coisas que são iguais a
uma terceira são iguais entre si. Se a coisas iguais se juntarem outras iguais,
os todos serão iguais. E se de coisas iguais se tirarem outras iguais, os
restos serão iguais.
O
que é uma coisa em si? Qual é a coisa que existe em si, e por si, e
independentemente do que queiramos perceber ou conceber dela? Berkeley
opunha-se a isto. Ao pensar numa árvore situada em lugar solitário onde
ninguém estava presente para a ver, pareceu-me que se tratava de conceber uma
árvore como existente sem ser percebida nem pensada, esquecendo que eu próprio,
entretanto, a concebia.
Como pode a matéria ser
causa das nossas ideias? Como pode produzir pensamentos a coisa que não pensa?
Pergunta
Roland Barthes: onde estão as coisas? No
espaço apaixonado ou no espaço mundano? Onde está o pueril reverso das coisas?
Oh, meu caro Horácio, ficai sabendo que
há mais coisas entre céus e terra do que sonha a nossa filosofia… mas vinde
como dantes, e sempre, e ajudai-me, por mais estranho que vos pareça o que eu
fizer…
Pois é. Coisas. Como se pode falar de coisas? Que coisas? Coisas
do arco da velha. Sim, claro. Coisas do diabo. E coisas loucas. Coisas e
loisas. Ele há coisas…
Há as coisas da vida. Choses. Choses de
la vie. Mas depois das coisas da vida ninguém se refere às coisas da
morte.
Coisas de comer, coisas de beber, coisas de vestir; coisas
de comprar e de vender. A coisa pública
– que dá uma carga de trabalhos tratar dela; e até conseguir
conceber-llhe a existência. E há o dizer coisa com coisa – seria a
homossexualidade das coisas. E mais aquelas vezes em que uma coisa não tem nada
a ver com a outra.
Ó homem, tu vais buscar cada coisa!
E quanto ao tal assunto, estás a ver, é destas
coisas…
Coisas e coisinhas. Beber coisinhas quentes, comer só
coisinhas macias. Tocar coisinhas fôfas. Evitar as coisas geladas. As coisinhas
boas que comemos. As coisinhas más que de vez em quando nos dão. Ou então…
comeste alguma coisa que te fez mal, foi o que foi…
A coisificação da vida também. A coisificação até das
próprias coisas. Ora aí está. Estamos
nisso. Tudo é um produto. Cada vez menos algo tem alma. Cada vez mais tudo é
coisa. E se alguma coisa não é coisa, pois coisifica-se para melhor se dominar.
Tudo se pode vender. Tudo se pode comprar. Tudo é cada vez mais concreto e
material. O espírito e o respectivo incomensurável metem medo aos simples que
cada vez mais somos. Há homens tratados como coisas. E mulheres.
Vivemos entre coisas. Até ao ponto de nos
transformarmos em coisas. É preciso reconquistar todos os dias uma soberania de
pessoa sempre comprometida pelas coisas que nos rodeiam, que tocamos e nos
assolam.
Mas há quem viva entre coisas e contra as coisas. A
cada um de nós é dado, num ou noutro momento, o nosso quinhão nesse combate
contra as coisas e a sua inércia. Pode entender-se como uma luta da liberdade
humana contra uma ordem social.
Há quem tenha o pavor das coisas, do que é só
porque sim; ou do que é para uma única finalidade e que por tal existe; ou do
que é por si e existe por si e só por si – conheço muitas pessoas/coisas
dessas.
Será para uns o viver entre as coisas o que os
angustia. Será para outros o viver entre as coisas o que lhes acrescenta o
prazer de viver. Será para outros o combate contra as coisas a razão de viver.
Será para aqueloutros sumo prazer o suportar apenas o poder das coisas.
Dizia
por outro lado certo comentador filosófico: é absurdo pensar que as coisas
visíveis nascem dos seus nomes. É impossível. Os nomes são o resultado da
convenção. As coisas visíveis não são resultado de convenção, são produtos do
impulso natural.
Há as coisas reais e há a nossa opinião a respeito
delas. Com o senão de as características qualitativas e intrínsecas das coisas
reais dispensarem bem a nossa opinião sobre elas. Já Kant o dizia: os objectos não são rapsódias de
sensações.
Quando as coisas se
apoderam do espírito, as palavras acorrem – como queria Séneca, o Velho. Ou como, não menos velho, queria Cícero: as
coisas atraem as palavras.
A tremenda força das
coisas é aumentada pelo uso da palavra, a palavra que designa a coisa, a palavra
que tantas vezes – e cada vez mais – substitui a própria coisa, a palavra que
designando a coisa, ou substituindo-a, extrai de cada coisa uma moral, a moral
que pode ou não ser a mais intrínseca moral de casa coisa, e que se não for
passa a sê-lo por intermediação da palavra. Palavra que aproveita a ausência da
coisa, que a representa ou que a mascara tornando a ausência em presença, em
alienação, em poder.
A
palavra relógio não nos mostra um relógio. Os sons que constituem a palavra
relógio não dão horas, não são o relógio, são a fracção imaterial eventualmente
contida num relógio.
A
palavra relógio cria o conceito e a forma de um relógio, ainda que possam não
existir relógios na materialidade do real. Há um significado que adere a um
significante, como diziam os antigos – e os antigos são os dos anos 60 do
século passado, quero eu dizer. Mas o significante não passa de uma
arbitrariedade. O significante sonoro re-ló-gi-o é aleatório. Aquele mostrador
com ponteiros poderia ter começado a ser designado por quaisquer outros sons e
nesse caso a sua materialidade objectiva talvez fosse diferente.
Relógio.
Como watch para os saxões – um nome que desencanta uma outra
materialidade; um outro mundo interior sob a forma do mesmo objecto; uma outra
organização sonora do visível; a palavra que engendra outra forma, um diferente
espírito; uma variação moral.
Forma,
conteúdo, significante e significado da coisa unidos na sua diferença da coisa.
As
coisas são os seres da natureza. Têm essa força. Assumiram o contorno de vida
que interveio sobre o caos e sobre a arritmia diabólica, recuperando as coisas
essa condição (de coisas) a cada momento, a cada confrontação com a
virtualidade do som da palavra que as designa, impondo, as coisas, a temível
liberdade da sua estrutura.
Há
leis que pretendem organizar o caos, ou seja, deter o movimento irredutível das
coisas. Mas são as coisas, com o seu poder, que acabam por desbaratar a força
das leis. Porque as leis são as palavras que a todo o momento lutam com a
essência das coisas.
A
palavra pretende dominar, assenhorear-se da realidade, a visível e a perceptível. A palavra pode impor
o inexistente pela força sonora e implícita de uma moral que não existe nas
coisas e no poder delas, essa moral que só a palavra faz existir e impor como
verdade às coisas que elas designam apenas um som.
As
palavras existem para fechar as coisas numa redoma de destino e significados.
Até que as coisas e o seu poder rebentem as grilhetas da moral da palavra e
imponham a sua linguagem de mutismos irredutíveis e não morais. E para esta
confrontação titânica e eterna concorrem os fenómenos da natureza, da política,
do quotidiano individual.
O
combate imemorial trava-se entre a superfície e o fundo.
Todo
aquele que compreende que duvida, compreende uma coisa verdadeira e está certo
dessa coisa que compreende. De uma coisa verdadeira é que ele está certo, logo,
quem quer que duvide da existência da verdade possui em si uma verdade acerca
da qual é impossível a dúvida. Mas só pela verdade há verdadeiro. Portanto, não
deve duvidar da verdade aquele que de alguma maneira duvidar.
O homem sábio, dizem, é o que respeita a ordem das
coisas. E não apenas isso. É o que, respeitando a ordem das coisas, as sabe
governar, às coisas, como convém.
E ainda com Aristóteles, ficamos na qualidade
suprema do homem que é sábio, e que é pôr cada coisa no seu lugar.
Mas será que há um lugar pré-determinado para cada
coisa? O que é um lugar? É um compulsivo escrínio para uma coisa? Ou a
existência da coisa determina e condiciona o destino de um lugar? O lugar em
função da coisa; ou a coisa em função do lugar que a contenha?
Mas uma realidade, quando ordenada para certo fim,
acha nesse fim a regra que lhe determinará o lugar na ordem geral do mundo.
Julgo que Tomás de Aquino foi quem disse que a
melhor disposição das coisas é a subordinação ao fim que lhes convém. E qual será o fim para as coisas?
O fim para todas as coisas é o bem.
O chefe encaminha os subordinados/coisas para o
objectivo da sua actividade. O médico determina a farmácia/coisa porque a saúde
é o objecto da medicina e dos medicamentos/coisas cujo lugar é a farmácia. O
objectivo da construção de um navio/coisa é a navegação.
Tomás de Aquino chamava às técnicas que comandam as
coisas de arquitectónicas, e os que as dirigiam, os arquitectos, podiam ser
chamados de sábios.
O último fim de uma coisa é aquele determinado pelo
autor da coisa, ou pelo menos pelo promotor dessa coisa. Se a coisa é o
universo imenso e inteiro, o seu autor é a inteligência. Donde, o fim supremo
do universo ser o bem da inteligência. E sendo o supremo sentido da
inteligência a verdade.
A verdade, para Aristóteles, é o princípio primeiro
de que depende a existência das coisas. De todas as coisas.
As
coisas em si poderiam estar submetidas a leis, ainda que não houvesse
entendimento que as conhecesse; mas os fenómenos são apenas representações de
coisas que não poderemos conhecer o que são em si. Como simples representações
não estão submetidas a nenhuma outra lei de ligação senão a que prescreve a
faculdade que conexiona.
Muitos
filósofos na esteira de Kant sustentam que as relações são obra do espírito e
que as coisas em si não têm relações, que é o nosso espírito que reúne as
coisas num acto único de pensamento, e que, assim, é o pensamento que produz as
relações que ele julga existentes entre coisas.
Tenhamos
a ousadia iluminista de aprofundar a natureza de uma coisa e descubramos que a
nossa acção de aprofundamento da natureza dessa coisa desemboca na descoberta
de uma nova coisa. E assim se superam as fronteiras entre o real e o ideal.
As coisas derivam da substância primordial, queria Anaximandro. E derivam as coisas da substância primordial por um processo de separação. Há uma substância infinita em movimento perpétuo, movimento pelo qual dessa substância se separaram os contrários, quente/frio; seco/ húmido…
O mundo infinito das coisas seria gerado pelos processos de separação que são propriedade da substância primordial. O ciclo das coisas durará então a eternidade. Mas a separação que gera as coisas é uma ruptura da unidade que é própria de todo o infinito. A separação das coisas da sua substância primordial é um princípio de diversidade. De onde imperava a homogeneidade e a harmonia desprenderam-se as coisas e criou-se, com a separação das coisas, o contraste.
A separação que originou as coisas criou para as
coisas a condição do finito. A condição de uma morte. Uma morte que é paga da
separação das coisas, do movimento das coisas. É paga, pela finitude, do
regresso das coisas à Unidade.
E lá dizia o enorme Heraclito que as coisas opostas
estavam unidas. O que não era exactamente o mesmo que estarem conciliadas, e
sendo a guerra o seu estado permanente.
Mas Hegel teimava, e queria, pelo contrário, para
as coisas opostas um estado de conciliação, e porque essa conciliação atestaria
das coisas a sua verdade.
Já Pitágoras queria que a substância das coisas
fosse o número; e queria que os princípios matemáticos marcassem o princípio
das coisas, de todas as coisas. Os números, e não a terra, nem o fogo, nem o
ar. Nos números distinguia Pitágoras a semelhança com as coisas, as que eram e
as que deviam ser. O número era uma causa material. O número era uma hipótese
de compreender as coisas, a probabilidade da moral que pode medir as coisas.
Será o número o modelo mesmo das coisas?
Porquê o número como modelo das coisas?
Por constituir, implícita, a ordem nas coisas, e
assim em função de uma perfeição ideal contida no número.
As figuras geométricas são os elementos
substanciais das coisas, dos corpos, princípios de realidade do corpo das
coisas.
E afinal de contas, a diversidade das coisas
depende da diversidade da forma das mais pequenas partículas que compõem as
coisas.
Quando é ele que a tem na
mão, essa cafeteira parece outra: parece
mais verdadeira. Em contacto com ele todas as coisas parecem
verdadeiras. Ele deita o café nas chávenas, vejo-o beber, e bebo, mas sinto que
é na boca dele que está o verdadeiro gosto do café. Quando ele se vai embora, o
café perde o gosto verdadeiro, desaparece o verdadeiro calor, a verdadeira luz. Fica apenas isto. Uma
cafeteira. (Deixa de uma peça de
Sartre já muito fora de moda, Les Mains Sales.)
O magnífico poder das coisas… a incrível inteligência
das coisas aparentemente inanimadas… a pequena peça da janela da minha marquise
que, inteligente e cruelmente, num dos períodos de maior frio deste inverno, se
decidiu pela inércia, impedindo a janela de ser fechada - uma manifestação de
poder e inteligência das coisas que me inspirou esta escrita. A soberania
esplêndida e o irresistível e dramático humor de uma membrana do meu
inteligente esquentador, que de conluio com a inteligência da peça da janela da
minha marquise, e que no pino da friagem da invernia decidiu deixar-me tomar em
paz e delícia os primeiros cinco minutos do meu banho quente, para depois,
passados os cinco minutos, sem aviso, me fustigar sardonicamente com a fracção
fria, gelada, da coisa que é a sua água.
As coisas… e o seu poder… e a sua ironia inerte… e
a força imbatível da sua moral… . digam os filósofos acerca das coisas o que
disserem…
Mas entre a janela da marquise e o esquentador pode
erguer-se na nossa vida uma outra e mais
maravilhosa coisa. Um espelho.
O espelho. Lembrei-me agora. Coisa poderosa entre
todas as coisas, porque dotada dos mais amplos e sinistros poderes.
O olhar e o sorriso da mãe é o nosso primeiro
espelho. Estamos nele. Não o somos. Só lá estamos. Porque desde logo, e
enquanto pequena coisa que somos, ansiamos por um lugar que nos contenha. E
seguimos o nosso impulso vida fora para abraçar esse espelho e sofremos porque
ele se estilhaça mal julgamos que nos temos a nós mesmos nos braços, e quando
esse nós-mesmos era somente representado numa coisa que era e ao mesmo tempo
não era esse nós-mesmos.
O espelho é a coisa que nos devolve o ser.
O espelho são os olhos que nos devolvem os olhos.
De onde pode decorrer o que os entendidos chamam de patologia do amor-próprio.
Entre a minha marquise e o meu esquentador olho
para uma coisa que arbitrariamente chamaram de espelho e amo a imagem de um
homem. Que sou eu? Sim, mas quem sou eu senão aquele que vejo numa coisa, numa
coisa chamada espelho, e de uma forma tão completa e complexa que eu nunca
poderei ver-me a mim mesmo num dado momento a não ser por intermediação de uma
coisa, um espelho.
Eu não existo. Só existe aquele que se move, e faz
caretas e sorri exactamente como eu e que está contido numa coisa. À qual,
arbitrariamente, emprestaram o som a que chamaram palavra – espelho; mirror para outros. Logo, eu sou eu e a própria coisa que
me informa da minha presença no mundo e na minha primeira qualidade de ser eu,
que é a ilusão de uma aparência comigo mesmo.
E entre as coisas e o seu poder descricionário há o
amargo sentimentalismo de uma lâmpada que se funde no ponto mais apaixonante da
leitura.
Há o moralismo exasperante das molas de uma cama
que rangem no momento físico que requer máxima concentração dos sentidos…
O antigo 1ºministro indiano Nehru revelou a André
Malraux uma ideia interessantíssima – e orientalíssima – acerca das coisas.
Chegara a Inglaterra e ficara muito interessado pelo conceito ocidental de
beleza. Entendia que o conceito ocidental de beleza procurava conquistar as
coisas, diversamente da ideia oriental de Nehru, que procurava libertar-se
delas.
O desejo da coisa, e não a possibilidade de fruição
da coisa.
Revertendo ao meu tão frequentado Denis de
Rougemont, encalho em Tristão e Isolda. Cada um será uma coisa para o outro.
Não se amam. Amam o amor. Amam o facto de amar. E, não se amando, concedem-se
uma condição de coisas, cada um como objecto/coisa da paixão do outro. Não se
amando, e amando somente a ideia de amar, permanecem sujeitos ao seu próprio
mundo, no seu próprio mundo, sem necessidade de objecto a amar, dispensando, por
assim dizer, a coisificação do outro. Diz Rougemont: Isolda nada faz para reter Tristão junto
de si. Um sonho apaixonado lhe basta.
Tristão
e Isolda. Têm necessidade um do outro para arderem de paixão, mas não um do
outro tal como cada um é; não da presença do outro; muito mais da sua ausência.
A presença do objecto amado é a coisificação desse
objecto. A separação pode compensá-los num subliminar contentamento mais do que
a presença do objecto vivo da paixão, a coisa. Sim, digo, a coisa em que cada
um de nós se torna logo que desejado e amado pelo outro.
O amor mais sagrado pelo outro/coisa pode ser só a
paixão de se sentir só no seu sonho. Um sonho sem coisas.
Há os pensadores que dizem que Deus é um intellectus archetypus, ou um intuitus originarius.
O que quer dizer que só pelo acto de pensar uma coisa, cria, realiza, produz
essa coisa.
Coisas que nada tenham de
comum entre si também não podem ser entendidas umas pelas outras, ou por
palavras diversas, o conceito de uma não envolve o conceito de outra.
Nada acontece sem que haja uma causa, ou pelo menos uma razão
determinante, ou alguma coisa que faça servir para dar razão a priori, porque
dada coisa é existente e não inexistente, e porque dada coisa é de uma forma e
não de qualquer outra. Quanto
às ideias das coisas corpóreas nada reconheço nessas ideias de tão grande e de
tão excelente que de mim não pudesse vir. E se as inspecciono mais de perto
acho que muito pouco nelas há que eu não tenha concebido clara e distintamente,
a saber: a grandeza (comprimento, largura, profundidade); a saber: a figura; a
saber: a situação que entre si mantêm esses corpos; e a saber: o movimento, a mudança de uma situação para
outra. Acrescentando eu ainda: a substância, a duração, o número, e demais
qualidades de natureza táctil, luz, cores, sons, cheiros, sabores. Acho-as no
meu pensamento tão obscuras e tão confusas que ignoro se as ideias que delas
concebo são ideias de coisas reais, ou se me representam seres quiméricos que
nunca poderão existir.
É
que pode haver nas ideias alguma falsidade material, que é quando representam o
nada como se fosse qualquer coisa.
Escrevi isto ao passar uma fase
má, em que me deu para ler. Aristóteles, Euclides,
Platão, Heraclito, Pitágoras, Anaximandro, Descartes, Bertrand Russell, Michel
de Montaigne, Séneca, Tomás de Aquino, Santo Agostinho, Shakespeare, Sartre,
Nehru, Berkeley, Denis de Rougemont, Roland Barthes, Kant, Leibniz,
Spinosa, eu sei lá…
Extremamente interessante esta abordagem reflexiva que tão poucos (cada vez menos...) fazem. "Sinal" dos tempos que vivemos e "símbolo" de quê? Fica a interrogação...
ResponderEliminarObrigada, Joel, pela sua "cruzada"...