MAS AFINAL ANDA TUDO DOIDO LÁ PELAS
MAÇONARIAS?
Se sempre é nas variegadas obediências maçónicas que se vão
tecendo os fios imperscrutáveis dos nossos destinos institucionais, e alguns
individuais, vamos lá com Deus (é o que dizem), porquê então se protegeu
Sócrates por tanto e tanto tempo e só se lembraram dele agora para entalar o
irmão Costa, e agora que o irmão Costa pode ficar de calças na mão por causa
dele?
O contrário também serve: porque é que se protegeu e
encorajou o irmão Costa no ataque ao poder no partido – e mais à frente no
governo – quando já se sabia (um ano de investigações) que uma vez alçado à
liderança, e com eleições à porta, o irmão Costa iria levar com a encomenda de
culpas do seu amigo e irmão Zé?
Anda tudo doido lá pelas maçonarias, ou quê?
Nunca as palavras do grande alcoólico inglês ao seu jovem
correligionário tiveram tanto cabimento aqui na pequena quintarola improdutiva
da Europa. “Não olhe para a bancada à sua frente, meu amigo, aqueles são os
seus adversários políticos; olhe é para a sua própria bancada, é lá que estão
os seus inimigos”, disse o velho Churchill.
Porque, não tenhamos dúvidas, cada vez aparece mais
evidente que uma ou várias mãos ocultas andam a manobrar os arames das
marionetas. E isto até faz lembrar outros tempos de crise profunda, os tempos
da rotatividade partidária dos últimos estertores da monarquia, os tempos da
grande desvergonha político-partidária, os tempos da tristíssima desmoralização
popular. Só faltava agora um atentado ao rei. E pouco depois a implantação de
outra república. E talvez seja isso o que se quer dizer quando tanto se fala de
crise de regime, quando tanto se diz que a democracia está doente e que o
regime está moribundo. Qual regime?
Quem deve ser desmascarado e em que tempo; e quem deve ser
protegido, e por quanto tempo.
O que deve ser divulgado e em que tempo; e o que deve ficar
oculto e por quanto tempo.
Questão de gestão do tempo e do segredo – missão das
maçonarias. Ou seja, uma e a mesma coisa, porque na política tempo é segredo.
A
Crise do Regime
O regime está em perigo.
Mas qual regime? O regime democrático em si, in toto? O regime do absolutismo
partidário? Deixemo-nos de fitas, esse nunca esteve tão florescente. E onde já
se viu uma democracia ocidental sem um regime de absolutismo partidário?
E se é a democracia em si que está doente e ameaçada,
estará então ameaçada por quem? E qual será a alternativa?
Nada disto as televisões explicam. Ou se explicam eu não as
percebo. Ou percebo de mais, e duvido, e desconfio.
Um golpe de Estado é que vinha mesmo a calhar, não? Feito
por quem?
Implantação de um regime autoritário que substituísse o
absolutismo pluri-partidário por outro absolutismo mono-partidário? E quem o
apoiaria? E a U.E. ia nisso? Claro que não. Emalávamos a trouxa e vínhamo-nos
embora de Bruxelas e do euro. E por quanto é que a brincadeira nos ficava?
Mas talvez o regime do absolutismo partidário não esteja em
perigo só em Portugal. Também por esse mundo. Ou mais concretamente por essa Europa.
E também é conveniente destrinçar as ambiguidades, ou a
ambiguidade dos conceitos. Regime. Democracia. Partidarismo.
Se são os partidos que estão em crise, porquê dizer que a
crise é da democracia? Ou a democracia está em crise sempre que o sistema partidário
o está? Se calhar é mesmo isso que eles querem dizer. Ainda que noutras
ocasiões digam que a democracia não se esgota nos partidos.
Mas pronto. Se se estabelece como dogma que não há
democracia sem partidos, bate certo, é porque o destino da democracia foi capturado
pelos partidos e estará eternamente amarrado a eles e respectivos interesses e
não se fala mais nisso.
Mas tudo deve ser mais interessante do que este meu
simplismo bacoco…
Segredo
de Justiça
Ai, filhos, mas qual segredo?
E vamos lá ver se nos entendemos: ou
segredo, ou justiça.
Não era mau, para a conservação do tal
regime e do tal Estado de Direito, que uma alma visse a público, já não digo
revelar os escaninhos do insondável, mas pelo menos levantar uma nesga da manta
que cobre quem viola o segredo de justiça e quem, desfeito em êxtases
orgasmáticos, se deixa violar por ele.
Sócrates já sabia de tudo. Já sabia que
o andavam a investigar. Já sabia que seria encanado mal pusesse os cotos no
aeroporto. Já sabia que andava debaixo de olho há muitos anos. Já sabia de quem
lhe andava há muitos anos a fazer a folha, a jurar pela pele. E sentiu-se
sempre protegido por “um escudo invisível” – invisível para os saloios profanos.
E na segunda-feira às dez e meia da noite perguntei-me que teria sido feito
desse “escudo”.
Não me digam que os violadores do
segredo de justiça são os mesmos que desmascaram quem eles acham que deve ser
desmascarado num dado momento e protegem quem eles acham que deve ser protegido
durante um certo tempo. Não me digam que os violadores do segredo de justiça
são os mesmos que decidem o que deve ser divulgado num dado momento e o que
deve ser mantido oculto por um certo tempo. Tempo e segredo. Não me digam…
As
Pessoas Ainda Insistem em Votar Naquilo em que Acreditam
Ouve-se dizer. Um justificativo para os
crédulos cívicos que ainda se dão à maçada de votar ao domingo, depois do banho
semanal, no regime do absolutismo partidário. E tem-se ouvido dizer isso aos
que mais razões têm para temer o fim do regime.
Mas em que é que as pessoas acreditam?
Em quê e em quem?
Acreditam nos deputados que se
auto-favorecem unanimemente (da esquerda mais esquerda à direita mais direita)
com aumentos de vencimento e outras regalias, e que ao cabo de 12 anos de
insano trabalho a levantar e a baixar os braços nas últimas filas do areópago
podem contar com a pingue reforma que o comum das gentes só aufere, e muito
menos pingue, depois de 40 anos a alombar e a aturar patrões e chefes?
Acreditam nos políticos que embolsam
subsídios de reintegração na “vida civil” quando deixam os cargos e que ainda
podem contar com uma subvenção vitalícia de alto lá com ela?
Alguém lhes dá condições para acreditar
nisso. Para acreditar em tudo – o que equivale a não acreditar em nada.
Ou ninguém lhes dá condições para acreditar na nobreza e na
generosidade dos que se dedicam à coisa pública.
Mas se as inocentes pessoas uma vez postas em face de tudo
o que na nossa vida institucional tem acontecido ainda acreditam é porquê? Por
estupidez? Por ignorância? Por desatenção? Ou é matéria de fé?
Se é por medo não se pode dizer que
acreditem do fundo da alma. Se é por necessidade, é por interesse e por
hipocrisia. Não vale. Isso não é acreditar. Nem é acreditar se for por inércia,
tipo “eles são todos uns canalhas, mas deixa ver se votando eu salvo os menos
canalhas de todos”. Inércia é desinteresse. Não vale.
Há os que se excedem no acreditar das
coisas e das pessoas. Devem ser esses os que votam. Acreditaram tanto e tantas
vezes que não têm coragem de pôr a si mesmo a dúvida de poderem ter andado
enganados na vida. Acreditaram tanto, afinal, em quem tinha o dever de lhes dar
condições para acreditar e só lhes deu razões para desacreditar, foi o que foi.
E há os que acreditaram tanto e tão
firmemente que se cansaram da realidade. Faz-me lembrar o ateísmo assanhado e
primário do que andou no seminário a estudar para padre, se veio embora, se fez
à vida, e acabou a julgar que finalmente tinha percebido tudo.
Os
Políticos não são Todos Iguais
Pois não.
Nem todos iguais nem todos diferentes.
À
Justiça o que é da Justiça e à Política o que é da Política
A mais doce balela impingida pela boca
daqueles que de tão traquejados nas manobras de uma e de outra disciplina não
acreditam já em nada de elevado e transpessoal, e já só pensam nas suas
conveniências pessoais ou de partido – ou de confraria.
É a conversa de chacha de quem tem
alguma coisa a esconder, de quem tem compromissos pelo menos no imediato
inconfessáveis, ou alguma culpa no cartório.
É a conversa dos que se habituaram em
40 anos (e talvez com razão) a infantilizar o eleitorado, os concidadãos, os
telespectadores, os leitores, o pagode, enfim, o contribuinte que lhes paga o
aumentado vencimento e a sumptuária.
À justiça o que é da justiça e à
política o que é da política? Então onde é que começa a justiça? Na lei, não? E
então quem é que fabrica as leis? São os juízes ou os políticos, esses deputados
do parlamento?
A César o que é de César e a Deus o que
é de Deus. Não é? É. Foi daqui que a imaginação pesadona dos comunicadores
políticos tirou o nauseante lugar-comum. E quem é César neste caso? Só podem
ser os agentes da justiça, os que tratam com o concreto vil. Porque a uma
qualidade de Deus, ou de deuses, só se arrogam nos media os da classe política, os eleitos.
A
República dos Juízes
À política-espectáculo algum dia teria
de suceder a justiça-espectáculo.
Então sempre é a implantação de uma
outra república aquilo a que temos estado a ver desfilar nos televisores.
Acabou o regime moribundo do
maximalismo partidário e está a ser implantada uma nova república que vai pôr
tudo no são, em pratos limpos, nos eixos – como se os juízes também não
gostassem de marisco, de música e de fardamentos novos.
A
república dos juízes é neste momento presidida, ao que parece na TV, pelo Dr.
Carlos Alexandre, o famoso juiz de instrução que pode mandar os mais altos
directores-gerais, os mais carismáticos políticos e os mais ricos e influentes
banqueiros para a enxovia.
E o que dá a ideia é de que esses juízes, doravante
tetrarcas da nova república, se estão a querer vingar de alguém. De quem
estarão os juízes a querer vingar-se? Ou porque estará cometida a um juiz a
função de vingar? E se está, quem os incumbiu, agora, hoje e não ontem, ou
amanhã, ou daqui a um ano?
Então não é costume encher-se a boca
com o Estado de Direito? E a quem caberá mais pertinência para governar esse
Estado de Direito do que aos juízes?
O raio do assunto chega a ter
ressonâncias bíblicas!
Justicialismo! Pois. Quem sabe?
Populismo! Oh.
O que parece começar a saber-se é que, assim
de um mês para o outro, passou a caber aos juízes a tarefa de desmontar e
desacreditar a trági-comédia da classe política.
Alguém tinha de o fazer, mais hoje ou mais amanhã. E quem
haveria de o fazer? Os jornalistas? Ora adeus. Esses que convivem tão
confortavelmente com os agentes políticos, que vivem deles e que os fazem
viver? Não lembrava nem ao diabo.
Há os que dizem que a política invadiu
os litúrgicos terrenos da justiça. Mas porque não ir ao invés das coisas?
Porque não pensar que foi a justiça, segundo directivas vindas do lado dos mais
alvos aventais, que se deu à ousadia de invadir a política? Sim, por uma
questão de moral, por uma urgência moral…
À política o que é da política inclui a
própria justiça, obviamente, quando estão em jogo homens políticos ou matérias
que caem no âmbito da decisão política. Porque tudo é (pode ser) política. Há
muito que se sabe disso.
E se do que se fala é do descrédito,
bem, hoje por hoje só o aparecer nos telejornais já torna um homem suspeito. Quanto
mais se, nem que seja muito ao de leve, esse homem mexeu numa massa nem que
seja de padeiro.
Todo o homem mediático é considerado importante. O ser
culpado ou inocente não é mais do que um pormenor. O essencial é que a
televisão o tenha tornado importante. E o ser importante e ter amassado alguma
coisa, à vista do povo que mais ordena, é o bastante para carregar às costas
uma culpa. Logo, é culpado de qualquer coisa até prova em contrário.
Pois é, já estamos na fase histórica da inversão dos sentidos
de muita coisa.
O
Assalto
O caso Sócrates apelou à minha
imaginação simbólica.
Sócrates é um símbolo. Um símbolo de
uma “nova gente” na vida política.
Sócrates é o mais desembaraçado e
impetuoso aventureiro da nova casta de aventureiros políticos. Sócrates é a
última figura de proa da renovação do pessoal político nacional começada nos
idos de 80 com o florir da gesta dos habilidosos, dos jovens leões ávidos de
imagem, ávidos de fortuna.
Sócrates é a mais recente vergôntea de uma classe de
borra-botas sem pergaminho político, de baixa estatura cultural e intelectual, transversal
à esquerda e à direita, que se deu ao desplante de assaltar as atmosferas
rarefeitas das elites, aproveitando a decadência das aristocracias
institucionais e fundacionais da democracia, dos Soares, dos Cunhal, dos Sá
Carneiro, dos Freitas do Amaral e de toda a gente de outra cepa que os
acompanhou.
A física tem horror ao vácuo, não é? O
apagamento político das figuras que nos habituámos a considerar éticas (não
obstante tudo, e na medida do possível em política) deixou espaço vasto aos que
na vida política não vislumbraram exactamente uma oportunidade moral de acção
em favor do colectivo; a queda dos senhores deixou espaço aos plebeus sem
contas a dar à História que assaltaram o poder a pensar primeiro no proveito
próprio.
Sem fazer comparações descabidas – e
muito menos falando de atropelos à legalidade – diria que foi Cavaco Silva quem
historicamente lhes abriu a porta. Sim, aos recém-chegados sem títulos de
nobreza na alta política, e por consequência à abrupta queda de qualidade do
pessoal político.
Foi Cavaco Silva quando foi dar uma volta até à Figueira da
Foz para rodar o seu novo Renault – podia
ser um Jaguar, ou um Mercedes, mas o estatuto social e
financeiro não subia a tanto. E mesmo ele, recém-chegado, já tinha sorvido das
aragens mais finas pela mão de um dos últimos grandes senhores, Francisco Sá
Carneiro, que o teve num governo seu como ministro das Finanças.
A partir da entronização de Cavaco
Silva foi o assalto dos plebeus ao poder, àquele poder que consiste em outorgar
benesses para ser remunerado mais tarde ou mais cedo por essa outorga. (Vidé,
entre outras, as personagens da tragédia do BPN).
Esperteza e aventureirismo. Capacidade de
truque – que outros também conheciam mas que tiveram a decência de não aplicar.
Subalternização da ética e da cultura. Um á-vontade de iconoclastas de reles
escalão. Deserto de ideias. Boçalidade de discurso. Milhões a entrar todos os
dias vindos de Bruxelas. Aproveitamento máximo das oportunidades lucrativas. Pragmatismo
irredutível. Visão estreita. Anseios de ascensão social (“pai, sou ministro!”).
Frequência da margem das legalidades. Desprezo pelo interesse público. Ambição
de baixo teor intelectual. Privilégio da prosperidade pessoal e do culto da
personalidade.
Sócrates, inocente ou culpado que seja,
foi mais um que descobriu o Estado como o grande filão do enriquecimento
pessoal – fala-se de malas com milhares e milhões de Lisboa até ao 16eme. arrondissement parisiense, de fraude
fiscal qualificada, de lavagem de capitais, de corrupção, não é brinquedo. Não
sei se é verdade ou mentira. Bem, alguma verdade deve haver, o problema é saber
como cresceram no fundo da gaveta os milhares e os milhões só com o salário (e
com a reforma e com a subvenção vitalícia) de primeiro-ministro. Nem sei se,
sendo verdade, e tendo sido conseguido com truques menos limpos, alguma vez ele
chegará a pagar por isso à comunidade. Quero crer que não – ainda que seja
verdade.
Mas também porque havia de ser ele o primeiro a pagar se
outros, tantos, ainda não pagaram e se duvida muito que algum dia cheguem a
pagar?
Pobre Sócrates. Alguém o protegeu anos e anos. Alguém lhe
tirou o tapete. Quem. Quando. Como. Onde.
E porquê.
Na segunda-feira passada. Eles. Porquê também eu gostava de
saber. E nunca saberei.
Deve andar tudo doido lá pelas maçonarias…
Maçonarias? Que é lá isso, hoje em dia, senão um pedaço de mito, conveniente e estúpido, para alimentar a ignorância dos coléricos impotentes? Ná. Eu não vou nessa conversa da "maçonaria" (qual delas?). Isso são as tretas de mestres-escola serôdios que nunca acertarão contas com a República, nem com a Democracia, nem com a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade...
ResponderEliminarCá para mim ele é mais cruzes, vaderretros satanás, tarrenego belzebus e muita, muita opus dei e dor de cotovelo duma certa cultura beata e sórdida de pura inveja mesquinha, retrógrada e com fedor a bafio dos tempos prévios ao próprio Vaticano II. Um cadáver moral, exumado em todo o Mundo civilizado, mas que ainda estrebucha em Portugal.
Curiosamente,alimentado entre nós com as cinzas, ainda quentes, de outro famoso cadáver, o do chamado social-fascismo...
Ai, vossas mercês julgam mesmo não acreditar em bruxas? Pois vejam lá, não venham algum dia a ser caçados...