MAS PARA QUE É QUE A EUROPA
PRECISA DE
CULTURA?
A Suécia é que está a dar. Na cultura.
Ou, aliás, o Norte. Em comparação, evidentemente, com o Sul.
Na Suécia? 90% de leitores – 50% na
Roménia e na Grécia, vá lá; em Portugal nem se sabe, são tantos. Suécia? 61%
dos habitantes foram a concertos de música clássica no ano passado. Portugal?
19% - mesmo assim, acho muito. Polónia? 22% - acho pouco. França? 33% - pouco,
pouquíssimo. Suécia no bailado e na ópera? Campeões. 34%, quatro vezes mais do
que Grécia, Portugal, Chipre. França? 25%. Ao que isto chegou: a França
culturalmente com melhores números do que a Alemanha e a Itália…
Dados do Eurobarómetro.
A Finlândia também marca pontos na
frequência das artes e das culturas. 12%. Parece que não é nada, mas é muito,
comparado com Hungria, Roménia e Grécia. E mais: 86% dos búlgaros, 82% dos
malteses (não admira, são malteses), 80% dos italianos (escândalo!) declararam
não ter posto os pés numa manifestação cultural nem ter praticado qualquer
actividade do género em 2013. Enquanto dois dinamarqueses em três foram a
concertos clássicos; enquanto só meio grego em quatro fez o mesmo.
Motivos (desculpas): a crise
financeira. Desculpa irrelevante, já se vê. O sinal dos tempos, outro
motivo-desculpa, e este sim, relevante, muito relevante mesmo.
E o sinal dos tempos é a declarada
indiferença dos menores de 25 anos pelas mariquices da cultura e da grande
arte. E o sinal dos tempos é o nível educacional decadentemente abaixo de cão –
e não só por cá.
E outro dado indicador: essa treta das
capitais europeias da cultura (de que nós por cá fizemos um bicho de sete
cabeças em 1994) deu o que tinha a dar, pouco, pelos vistos. Outro dado ainda
(oh, este sim!): os mercados.
Os mercados! Os mercados!
Em Itália, a contribuição do Estado
para a actividade cultural choca, dizem, e falando de teatros, com a
intransigência sindical – que pensava eu ser pecha de outros tempos – que
obriga esses teatros a produzir cada vez menos para poder pagar salários a um
pessoal que cada dia tem menos que fazer.
Em Espanha as coisas lá vão andando
assim-assim, embora sem público que chegue. Por causa da ferocíssima competição
entre regiões. Nenhuma quer ficar atrás da outra nos alindamentos de
superestrutura da coisa cultural e todas elas foram construindo auditórios,
alimentando teatros de ópera, Valência, Valladolid, Barcelona, Sevilha,
Alicante, Pamplona, Saragoça, em suma, elefantes imaculadamente brancos e
pomposos às moscas porque o público não tem condições de desembolsar os altos
preços do bilhete.
Na Alemanha persiste o problema da
superabundância de estabelecimentos culturais após o redimensionamento do país
seguinte à queda do Muro, e no que muito especialmente toca à grande quantidade
de orquestras do mais alto coturno.
Mas para que é que a Europa precisa de
música, não me dizem?
Para que é que a Europa precisa de
cultura?
A Europa desencoraja crescentemente o
fomento das artes. Não são precisas. Pelo menos por agora. Lá mais para o
verão, depois da crise, logo se vê. O que faz falta são os mercados a
funcionar. A estatística do Eurobarómetro fala como gente.
E não há melhor e mais gritante
evidência do tal sinal dos tempos do que a Internet. A Internet é a totalidade.
A Internet é o totalitarismo do momento histórico que dispensa bem a ideologia,
grande vantagem. A Internet pode tudo – até pode ajudar a compor música, ao que
leio. A Internet desbancou o totalitarismo televisivo para os menores de 30
anos. A Internet cria experts em
tudo, cria entendidos, opinadores, colecionadores. E até tipos cultos. E até
tipos inteligentes. E até artistas.
Europa. Pff. Atenção à cidade de
Estrasburgo, uma das capitais da Europa. O pessoal de lá planeou ao milímetro o
76º Festival de Música de Strasbourg. Coisa fina, de primeira água. Cartazes de
sonho. Programação que era um mimo. Tudo pronto ao nascer do dia 4 de Junho
pretérito, quando faltavam três dias para a inauguração de tão auspicioso e
refinado festival de música.
Mas o pessoal lá de cima, do escritório, manda
dizer cá para baixo:
- Rapazes, eh!, pessoal da ferrúgem... parem com tudo.
- Parar com tudo?
- Sim, não discute.
- Porquê? Isso não pode ser.
- Ai não pode?
- Pois não, parar porquê?
- Ora porquê, vocês têm cada pergunta… pelo
motivo do costume, não há verba, a verba que há é precisa para coisas mais
importantes.
- Mas ó senhores lá de cima do escritório,
Estrasburgo é a sede do Parlamento Europeu.
- Pois é, mas essa palhaçada do festival de
música pode ser muito bonito, mas não serve para nada e é muito caro. Vá, menos
conversa, comecem lá a arrumar a tralha.
- Em Estrasburgo, uma das capitais da Europa…
da Europa da cultura?
- Sim, rapazes, foi a Europa da cultura em
tempos que já lá vão. Para que é que na era dos mercados a Europa precisa de
cultura?
Penso que a Europa se deveria cultivar, não nos mercados e nas "lavagens", mas naquilo que foi um dos berços do mundo actual. Cegos são os tempos. Abç
ResponderEliminar