SOBRE A ELITE PORTUGUESA PAIRA UMA
QUADRILHA DE
MALFEITORES
Nem percebo porque é
que tanta gente insiste em chamar tantos nomes ao insignificante pau-mandado do
Passos Coelho, que nunca fez, nem fará, espero, parte das elites do país…
E depois de o
estranho caso da pré-época futebolística do Benfica ter iluminado a consciência
nacional sobre as realidades nacionais e sobre a própria realidade das elites é
que se percebeu que o perigo podia vir daí. Das elites, sim.
As elites. As nossas
elites. As elites nacionais. Os magníficos do sonho português de grandezas…
E eu só pasmo é como
o esplendor fulvo do meu pessimismo descrente nunca tenha dado para sequer
conceber do que poderia ser capaz essa elite portuguesa, nacional, nossa.
Que diabo, ainda que
se admitisse lá pelo meio uma ovelha ranhosa, enfim, era como o outro. Mas eles
eram ministros, secretários disto e daquilo, autarcas, economistas, advogados,
doutores e engenheiros de tudo e de mais umas botas, deputados, banqueiros (de gabarito
internacional, atenção), presidentes e vice-presidentes de tudo e de mais alguma
coisa… e se isto não é a elite de um país vou ali e já venho…
Se esta não é a
elite nacional, onde está a elite nacional?, pergunto eu, panfletário consumidor
de um PREC qualquer.
É gente de óptimo
falar, de fato e de gravata e de sapatos de vela. É gente que brilha nas festas
do jet set, nos torneios de ténis,
nos greens mais afamados…
Olhámos para eles
com admiração, e até respeito, enquanto o vulgo ignaro se esvaía nas maiores
cobras e nos maiores lagartos contra o cínico incapaz do Passos Coelho, contra
a consciência intermitente do Cavaco, contra a irrevogabilidade do Portas,
contra a alegre patetice do Seguro, contra a já desusada fala angulosa do
Gaspar. Inútil. Nunca esses serão elite de coisíssima nenhuma.
A gente da
verdadeira elite era gente que outra gente se desunhava para imitar. Era gente
exemplar. Da habilidade para ganhar dinheiro ao corte de cabelo; do vocabulário
ao corte do fato.
Era gente de
confiança. Era gente sólida de princípios, impoluta de desígnios.
Era gente de
supervisão – visão por cima e para além dos outros; a metade da elite que
supervisionava a outra metade da mesma elite.
Era gente de
regulação – a metade da elite que regulava os passos que a outra metade dava no
chão escorregadio dos mercados.
Era a gente fina que
habitava o espaço português da fantasmagoria.
Era a gente fina que
respirava na atmosfera liquefeita das finanças nacionais.
Eram eles os ungidos
como a parte mais grada da resolução do problema – que todos nós, o país
todo, constituímos.
Mas afinal não,
porra!
Mas afinal são eles
os ungidos como a parte mais nutrida do problema – que todos nós somos.
Quantos deles são
suspeitos de uma ou duas falcatruas das grossas? Quantos deles são ou já foram
arguidos por qualquer outra vigarice de bradar aos céus?
Quantos deles foram ou serão condenados? Poucos. Os fortes de uma elite não são condenados, uma verdade universal…
E nós sem sabermos
da missa a metade…
Mas afinal, a nossa
elite, a elite que nos dominava e povoava os nossos sonhos, é a elite que aos
poucos, com tudo o que alguma outra elite vai desvendando aos poucos, mais se
parece com uma quadrilha de malfeitores que vai às festas e ao ténis, sim
senhor, que veste e que fala e que luxa asiaticamente, e fica na foto do
destino mais parecida com uma elite de torvos trapaceiros compulsivos do que
com um núcleo duro de homens bons.
O sistema financeiro português esteve no fio da navalha, disse o
outro, um dos de uma outra e aparente elite.
Na nossa boa fé, e
sem sabermos da missa a metade, pensávamos todos que os autores do crime que é
a nossa realidade social e económico-financeira só poderiam ser ou o o
parisiense Sócrates, ou o anedótico Passos Coelho, ou o periclitante Cavaco, ou
o tergiversante Portas, ou a espevitada Maria Luís, ou o antipático Gaspar… no
limite, sabe-se lá, o cagarola Seguro, o emergente Costa…
Mas afinal não.
Porra!
Não eram esses os
autores do crime da nossa tola e abominável realidade. Ou não eram
absolutamente, totalmente, eles.
Pois não. Eram as
nossas mais estimáveis e estimadas elites.
Só perde quem tem,
quem não tem não perde nada – diz o povo fantasticamente soberano e sábio.
Mas quando o outro diz
que enquanto dormíamos a sono solto o nosso sistema bancário esteve por uma
unha negra, apesar de toda a alegria de uma espectral prosperidade e de um alucinado
equilíbrio dos sistemas que nos fazem sobreviver, e mesmo sem sabermos da missa
a metade, dá-nos na telha para pensar o contrário do popular e desactualizado rifão… quem perde
é quem não tem, e quem tem continua a não perder nada.
E com tudo isto
estou sem saber onde guardar o meu dinheiro, o meu rico dinheirinho tão chorado
e tão chupadinho das carochas pela autoridade tributária.
Em casa? Debaixo do molaflex?
Ao arbítrio da honrada ladroagem?
Sim, aí talvez
esteja seguro, porque tudo o mais é marketing,
publicidade enganosa, courts de ténis,
carros de topo de gama, fatos de luxo, jet set, propaganda disfarçada, altas
mansões, malfeitoria impune.
Há quantos invernos
não cai um pingo de verdade na orgulhosamente desfraldada bandeira das quinas?
Sem comentários:
Enviar um comentário