A ESQUERDA
E A DIREITA
DESNECESSÁRIAS,
OU O UNISEXO POLÍTICO
OU O UNISEXO POLÍTICO
E pelo
caminho que a democracia portuguesa leva já não me admiraria absolutamente nada
que o próximo P.R. fosse o Manuel Luís Goucha que todos os dias nos entra pela
casa dentro via televisão.
Por essa ordem de duvidosas ideias
estimo que a primeira mulher P.R. portuguesa venha a ser a Teresa Guilherme, se
estiver para aí virada.
Mas também pode ser a Júlia Pinheiro.
Ou
mesmo a Bárbara Guimarães – que até já gozou de conjugal estágio político.
É preciso aparecer na televisão todas as
semanas. Se for todos os dias mais hipóteses terá de ganhar umas eleições.
Esquerda e direita? Por amor de Deus, o
pessoal já lá não vai com dicotomias, diferenças. É preciso que tudo pareça
politicamente igual. Igual ao litro, é o que é.
O pessoal já não se comove politicamente nos terrenos de
esquerda e direita. A consciência político-ideológica do eleitorado só precisa
da repetição de uma cara, só espera um sinal dado pelas televisões para votar
em conformidade.
A desnecessidade de esquerda e direita
pode indicar que os novíssimos tempos consagraram a desnecessidade da própria
política, quando tornam cada vez mais necessários a economia e o futebol.
José Gomes Ferreira, editor de economia
da SIC, não seria mau de todo, e pode bem vir a ser eleito P.R. por aparecer todas as semanas no pequeno
ecran e por não se descoser quanto às suas simpatias economicistas, se liberal
se não, se assim-assim, se um dia uma coisa e noutro dia outra.
Jorge Jesus, quase diariamente na
televisão, daria um bom P.R. em zero de cultura, zero de pensamento, pronto a
ganhar eleições com uma perna às costas.
José Mourinho, outro possível. Porque não
Cristiano Ronaldo – até se poupava na verba para a estátua?
O Pinto da Costa está velho, mas Bruno de
Carvalho, não sei não…
O Tony Carreira também não seria mau…
Potenciais candidatos à presidência da república portuguesa não faltam, graças a Deus.
Todos estes são fenómenos emergentes
perfeitamente compatíveis com o inimigo jurado quer da esquerda quer da
direita: o centro político, o que tanto faz ou o que tanto dá para um lado como para o outro, o unisexo político, o divertimento fácil e fútil, o
nada, o vazio, televisão, redes sociais. Enfim, tudo o que realmente nos
governa.
Eu, que sou do tempo em que a política
era assunto sério e não era para ser discutida por badamecos, e em que o ser de
esquerda ou de direita fazia toda a diferença na compleição de um homem, enternece-me
quando vejo e oiço na televisão os dignitários do PS encherem a boca de
esquerda. Se o PS (o de hoje e o de sempre) é de esquerda, então vou ali e já
venho e quero ser de direita.
O sensível Bloco é mais de esquerda nas
magnas causas dificilmente tragáveis por uma esquerda ou uma direita
convencionais, sejam elas o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou sejam
adoção de crianças por essas mesmas pessoas. No resto, jogam o jogo trivial dos
sedutores de eleitorado televisivo e apolítico.
(Nojento reacionário eu? Isso é que era
bom: se não há esquerda nem direita que prestem e dignas desses nomes antigos,
também não pode haver reacções a elas.)
Uma réstea de esquerda no PCP. É bem
capaz de haver. Especialmente nas influências sobre o mundo sindical, nas greves
dos tão bem pagos maquinistas do Metro que podem paralisar a vida da cidade. No
entanto, e pelos últimos escrutínios nacionais, é uma esquerda que se tornou
desnecessária, que persiste em consignas e práticas que pouco interessam aos
valores televisivos do eleitorado e lhe acentuam a desnecessidade a cada
consulta eleitoral.
No passado dia 24 elegemos um presidente
da república que se tem distinguido na televisão todos os domingos como um zero
político. Um vazio. Uma irrelevância. Um centro. Claro, tudo isso quando não se
trata de praticar um número de político ilusionismo intriguista.
E ao arrepio dos que o criticaram, e lhe criticaram a
eleição, eu acho que a entronização do Prof artista televisivo corresponde na
perfeição à partitura dos tempos. As pessoas têm a sua vida, não estão para se
ralar, querem divertir-se seja como for e à custa do que for, e nesse quadro,
para presidente da república, não se pede mais do que um zero, uma irrelevância
que não chateie, um vazio, um centro.
Talvez por tudo isto seja legítimo e
apreciável o que o bom senso político balizado noutros tempos por esquerdas e
direitas diria ilegítimo: as eufóricas festividades de quem acaba de ser eleito
como mais alto magistrado da nação por 50% de 50% dos nacionais dessa nação.
Quer-se dizer: um presidente de todos os portugueses que só um quarto desses
todos portugueses admite como seu mais alto magistrado. O quarto mais pândego de
todos os portugueses verdadeiros apreciadores do entretenimento político, do
show televisivo.
Mas não estou para desfazer nas excepcionais
qualidades de inteligência arguta do Prof reinadio, nem na sua alta capacidade
técnico-jurídica, nem na sua cultura. O que me sobram são dúvidas sobre as
valências dele não como fácil opinador, mas como real actor político na hora em
que não caiba margem para a prestidigitação retórica e para a intriga sagaz.
Estou como diz o cego: vamos a ver…
Na verdade, enquanto os portugueses não mudarem, nada vai mudar, vamos continuar a assistir a estas "quintas" aos "futebóis" e a rapaziada lá se vai governando e aos amigos também. É um lugar comum, mas é a realidade, cada povo tem o governo (e o (p)residente que merece... Bem haja
ResponderEliminarSim, concordo. Este pândego Marcelo pode bem ser o ponto zero da Política.
ResponderEliminarMas atenção, um zero é superior a todos os números negativos que, estupefactos, vimos irradiar de Belém nos últimos dez anos.
E um zero em Política pode contudo ser um valor positivo em termos de Moral política, que é talvez o que mais terá faltado a Portugal na última década.
E um valor positivo em Moral política pode até conjugar-se bem com um valor muito positivo em Política, como poderá vir a ser esta unidade da Esquerda na Assembleia da República, pela primeiríssima vez após 40 anos de Constituição da República!
Que pela primeiríssima vez desde o 25 de Novembro coloca desafios aparentemente intransponíveis à Direita portuguesa atual, restauracionista, saudosista e, sobretudo, revanchista.
A ver vamos então, como dizia o cego - sendo que o pior cego de todos é aquele que nunca quis ver...